Ásia mantém subsídios
As nações mais industrializadas do mundo pediram aos produtores de petróleo que aumentem seus investimentos, um dia depois do maior aumento no preço do barril da história. Os ministros de Energia permaneceram divididos sobre subsídios aos combustíveis. Japão, Estados Unidos e Coréia do Sul pediram o fim dos pesados subsídios em países asiáticos. China e Índia responderam que só poderiam aumentar os preços locais gradualmente, devido a suas fragilidades econômicas.
Folha de São Paulo Exército e Marinha se unem para definir futuro de fortificações
Órgãos criam força-tarefa para discutir modelo de preservação de patrimônio
MALU TOLEDO
A importância histórica dos fortes uniu militares a técnicos em conservação de monumentos. Exército e Marinha formaram com o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) um grupo-tarefa para definir o futuro das fortificações brasileiras.
O trabalho feito no Museu Histórico do Exército, no forte de Copacabana, que sediou o primeiro encontro nacional para discutir o tema anteontem, pode ser usado como modelo.
Há 42 fortificações tombadas no país e mais quatro a serem tombadas. Segundo Cyro Côrrea Lyra, assessor técnico da presidência do Iphan, o Brasil teve cerca de 400 fortes, muitos deles desapareceram, ruíram ou foram invadidos.
Em alguns Estados, como São Paulo, o Iphan já faz parcerias com os militares. Segundo o superintendente regional do Iphan em São Paulo, Victor Hugo Mori, o complexo do porto de Santos, com cinco grandes fortificações, tem condição de se transformar num grande centro de visitações. Mori quer usar a educação patrimonial para ensinar sobre a história do Brasil. Ele tem o projeto de fazer um "túnel do tempo" dentro do complexo do forte de Itaipu, o maior do Estado.
Durante a caminhada, os visitantes assistiriam em uma projeção à formação geológica da serra do Mar, passando pelas construções dos fortes, até chegar ao século 21, na saída do forte, área de difícil acesso hoje.
Dos fortes tombados, alguns ainda são militarmente ativos como o forte de Itaipu, em Praia Grande, e o forte dos Andradas, no Guarujá, onde o presidente Lula costuma passar férias. Outros são controlados pelo Iphan, como o da Ilha do Mel, no Paraná, que tem o número de visitantes limitado.
Os demais são administrados por governos estaduais, municipais e até por universidades, como o caso de Santa Catarina.
Forte de Copacabana
A fortificação mais recente do Rio, parece ser a mais "moderninha". Inaugurado em 1914, o forte de Copacabana, tem atraído cada vez mais público e eventos ecléticos, como uma roda gigante no verão. Em julho, terá exibições de filmes do festival Anima Mundi.
O trabalho social, com jovens do morro Pavão/Pavãozinho, e com alunos da rede pública foram citados como projetos a serem seguidos em outras fortes.
Além do trabalho social, o coronel Edson Silva de Oliveira, diretor do Museu Histórico do Exército, se preocupa em atrair mais público e conseguir recursos, com o aluguel do espaço. Ele disse que há três anos, quando assumiu o forte, o número de visitantes passou de 60 mil para 350 mil
Folha de São Paulo BASE DE MANTA
EQUADOR BARRA FRAGATA DOS EUA
O Equador proibiu nesta semana uma fragata da Marinha americana de ancorar em Manta, sudoeste o país, onde os EUA usam uma base militar sua para operações aéreas antidrogas, informou o capitão Patricio Mora segundo jornais locais. A embarcação, acusada por pescadores de afundar barcos de bandeira equatoriana em águas territoriais do país, foi barrada por violar a soberania nacional equatoriana duas vezes em maio.
Um acordo permite que os EUA usem a base aérea até novembro de 2009. Mas o presidente equatoriano, Rafael Correa, afirma que não renovará a concessão.
Folha de São Paulo Investimento da China deixa a AL em segundo plano, diz especialista
Chineses preferem negócios com regimes autoritários, afirma americano
RAUL JUSTE LORES
Quando o presidente chinês, Hu Jintao, visitou a América Latina, em 2004, prometeu investir US$ 100 bilhões no Brasil e na Argentina. Menos de 0,1% disso chegou ao Brasil -em 2006, último dado oficial chinês, só US$ 71 milhões foram investidos no país- de um total de US$ 21 bilhões que as empresas chinesas investiram no exterior naquele ano.
Os chineses compraram campos de petróleo no Cazaquistão, minas de ferro na África do Sul, a companhia de telecomunicações do Paquistão e a divisão de computadores pessoais da IBM pela Lenovo.
Para um especialista nas relações comerciais chinesas, a América Latina pode esperar sentada. Os investimentos virão, mas vão demorar.
"A China prefere investir onde você fala com quatro autoridades e fecha negócio, sem esperar barreiras políticas e jurídicas depois. Nessa situação, ditaduras africanas levam vantagem", diz o jornalista americano Joshua Kurlantzick, que há dez anos acompanha o esforço de relações públicas chinesas pelo mundo.
Seu estudo originou o livro "Charm Offensive - How China's Soft Power Is Transforming the World" ("Ofensiva de Charme - Como o Poder de Persuasão da China Está Transformando o Mundo"), da Yale University Press.
Além de investimentos, o governo chinês investiu pesado na cooperação internacional com empréstimos a países pobres, uma política de boa vizinhança no Sudeste Asiático e um discurso de não-intervenção oposto ao da gestão do presidente americano, George W. Bush. Leia os principais trechos da entrevista que ele concedeu, de Washington, à Folha.
Estabilidade à chinesa
A China vai investir muito pelo mundo. Mas vai demorar um tanto. As promessas de investimentos foram parte de uma estratégia para conquistar aliados. Quando se trata de ir atrás de matérias-primas ou fazer investimentos pesados, os chineses ainda se sentem mais confortáveis em falar com quatro autoridades poderosas e fechar o negócio rápido, sem temer problemas futuros. Essa "estabilidade" que os chineses buscam é mais fácil de obter em regimes autoritários, como as ditaduras africanas, em que a China colocou muito dinheiro.
Os chineses investiram na África do Sul, que é uma democracia, mas que o partido do governo tem pouquíssimas chances de ser derrotado. Mudanças de partidos, de atores, relatórios de impacto ambiental, leis trabalhistas e outras barreiras burocráticas certamente afugentam os chineses.
Terras no Brasil
A China quer comprar terras no Brasil, na Argentina e em outros países para produzir alimentos para saciar sua população, mas é algo que desperta reservas em qualquer país. Imagine que um americano quisesse comprar muitas terras no Brasil, nem precisa ser na Amazônia. Choveriam críticas.
Comprar expertise
A estratégia chinesa tem sido a de comprar outras empresas para ganhar uma marca e conquistar expertise. Há certas coisas que as empresas chinesas ainda não estão preparadas para enfrentar se forem para o Ocidente. Experimente voltar a uma loja na China em que comprou um produto que deu problemas uma semana depois da compra. É um desespero. As empresas não têm o menor know-how em serviços.
Executivos chineses
Empresas e governo decidem investimentos de forma intimamente relacionada. Os chineses têm investido mais em países de sua esfera de influência, sobretudo no Sudeste Asiático. Executivos chineses na Tailândia me disseram que o país era favorável porque ali eles podiam colocar seus filhos em escolas com mandarim no currículo e tinham restaurantes chineses por todos os lados. Esses executivos pesam nas decisões. Fora São Paulo, em que outra cidade do Brasil eles teriam essas possibilidades?
Sem desagradar aos EUA
A China respeita o Brasil, mas é bem cautelosa com o que considera a "área de influência dos Estados Unidos".
Folha de São Paulo Terrenos da Amazônia são negociados por corretores em páginas da internet
Corretores brasileiros e estrangeiros anunciam na internet terras na Amazônia a preços milionários. Por US$ 60 o hectare, o italiano Giovanni Caporaso oferece terras em Lábrea (AM), onde há anos grileiros e madeireiros ignoram as leis. De Miami, a corretora brasileira Denise French vende área preservada com praia paradisíaca às margens do rio Negro e tribos indígenas dos séculos 17 e 18 por US$ 99 mil.
O preço da área chamada Seringal, no município de Pauini (AM), é a negociar. Mas, de acordo com o anúncio do site registrado na Ucrânia, é possível encontrar lá ouro, prata, gás natural e petróleo. O escritório de advocacia Wheeler Wolf, em Dakota do Norte, nos EUA, aparece como o responsável pelos termos do contrato, estimado em US$ 3 milhões.
"Oferecer terra não é crime. Mas por trás dos sites podem estar estelionatários", afirmou Jorge Pontes, chefe da Interpol no Brasil, que já chefiou o departamento de Repressão a Crimes Ambientais da PF.
Um dos sites, administrado pelo italiano Caporaso, oferece muito mais que propriedades na Amazônia. De Roraima ao Rio Grande do Sul, é possível vender e comprar imóveis no Offshore World Brazil. "Disponibilizamos nossa página para as pessoas anunciarem. Às vezes, compramos para vender."
Além de terrenos, é possível comprar árvores, para ajudar na preservação. Há ONGs que vendem diferentes espécies da fauna brasileira a preços que variam de US$ 1 a US$ 65,99.
Ana Cristina Conceição Larson, brasileira que vive há mais de nove anos nos EUA, também não vê problema em vender terras, na Amazônia ou em qualquer outro lugar do país.
Há, porém, inquérito aberto na Superintendência da PF no Amazonas que investiga site em seu nome, registrado em Bismarck, na Dakota do Norte (EUA). A brasileira diz desconhecer a investigação e alega que os imóveis que vendiam eram regulares. "Nunca aceitei nada que não fosse legal, que não tivesse documentação."
Folha de São Paulo Mato Grosso tem maior área registrada por estrangeiros
São 1.377 propriedades rurais espalhadas numa extensão de 754,7 mil hectares
FERNANDA ODILLA & HUDSON CORREA
Estrangeiros estão comprando propriedades rurais em todos os Estados do Brasil. Levantamento inédito do Incra revela que o interesse estrangeiro vai muito além da Amazônia. Com 1.377 propriedades espalhadas numa área de 754,7 mil hectares, Mato Grosso é o Estado que tem a maior área de terras em nome de empresas e pessoas de outros países.
São Paulo, por sua vez, é o campeão em número de propriedades em nome de pessoas de outras nacionalidades. São 11.424 terrenos, que, somados, representam 504,7 mil hectares do território paulista. Mato Grosso do Sul, Bahia, Minas Gerais, Paraná e Goiás também estão no topo da lista do Incra como os Estados com maior área nas mãos de estrangeiros.
Somente 3,8 milhões de hectares dos 5,5 milhões registrados em nome de estrangeiros já foram organizados por Estado, número de propriedades e tamanho de área. O mapeamento do Incra revela a situação dos imóveis até dezembro de 2007.
Desde 1998, o órgão controla só a aquisição de imóveis rurais por empresas sem sede no país ou pessoas físicas não residentes no Brasil. O presidente do Incra, Rolf Hackbart, espera parecer da Advocacia Geral da União para contabilizar e monitorar a ação de estrangeiros que se associam a empresas nacionais para investir aqui.
Os números do Banco Central comprovam que a ação internacional aqueceu o mercado local. Os investimentos diretos estrangeiros em atividades imobiliárias aumentaram 347% entre 2003 e 2007.
"O presidente Lula esqueceu que temos Constituição e abriu o país à ganância estrangeira", disse d. Tomás Balduíno, presidente da Comissão Pastoral da Terra. Balduíno acompanha com preocupação o crescente investimento estrangeiro e a especulação imobiliária, impulsionados pela fartura de terras brasileiras propícias a minimizar a crise mundial de alimentos e a impulsionar a produção de biocombustível.
Plantações de soja, cana-de-açúcar e eucalipto são as atividades que hoje mais atraem os estrangeiros, em especial nas regiões Nordeste e Centro-Oeste. "Mato Grosso ainda é um lugar onde se pode expandir [a produção]. Tem boas terras. E o preço ainda é acessível. Então, os produtores mato-grossenses estão endividados e estão vendendo", diz o presidente da Aprosoja (Associação dos Produtores de Soja do Estado de Mato Grosso), Glauber Silveira da Silva.
Silva cita o grupo argentino El Tejar, há seis anos no Estado e em expansão. O grupo mantém a empresa O Telhar Agropecuária, que planta milho e soja em 35 mil hectares no Estado. Ele também destaca a expansão da SLC Agrícola, grupo brasileiro que é o maior produtor de algodão do país e capta recursos no exterior.
A empresa assinou em março contrato de financiamento com o IFC (International Finance Corporation), braço de investimento do Banco Mundial, no valor US$ 40 milhões para aquisições e arrendamentos de terras. Na quinta-feira passada, a SLC comunicou a compra de 10.635 hectares em Campos de Júlio (MT), por R$ 82,9 milhões.
Na lista do Incra, os Estados da região amazônica não ocupam lugar de destaque. Secretário do Meio Ambiente do Amazonas até março passado, Virgílio Viana disse que, "do ponto de vista racional, é muito mais grave a ameaça estrangeira em controlar as praias do Nordeste brasileiro". "Você saiu de uma praia e entra em outra comprada por gringos, quilômetros e quilômetros. Em termos de presença estrangeira, é muito mais grave." Ele foi consultado pelo empresário sueco-britâncio Johan Eliasch em 2005 sobre a compra de 160 mil hectares no Amazonas.
Eliasch usou uma estratégia comum entre estrangeiros: associar-se a uma empresa nacional ou abrir uma empresa no Brasil, mesmo que seja controlada por capital externo. É o que japoneses e norte-americanos têm feito em Correntina, oeste baiano, numa área de 60 mil hectares adquirida para produção de algodão e instalação de usina sucroalcooleira.
O superintendente de política de agronegócio da Bahia, Eujácio Simões, afirma que o Estado incentiva o investimento de empresas nacionais com aporte estrangeiro. Mas diz que, em alguns casos, o governo se preocupa em conter a expansão. "Os finlandeses comandam a produção de celulose no extremo sul do Estado e estão esperneando para aumentar a área de plantio." No Brasil, é necessário esperar seis anos para o corte das árvores. Na Finlândia, são 15 anos, diz ele.
Folha de São Paulo Restrição a estrangeiros divide especialistas
Proposta de dificultar compra de terras ao capital estrangeiro é vista tanto como questão de soberania como de xenofobia
A divulgação de que o Incra busca uma solução jurídica para dificultar a compra de terras por empresas brasileiras controladas por capital estrangeiro divide especialistas. Enquanto alguns defendem a medida como uma questão de soberania nacional, outros vêem traços de xenofobia na proposta.
Conforme a Folha revelou, o Incra receberá um parecer da Advocacia Geral da União para fixar limites para a aquisição por estrangeiros. As regras vão valer para todo Brasil, mas o alvo principal é a Amazônia.
Eduardo Viola, professor titular de relações internacionais da UnB (Universidade de Brasília), diz que impor uma proibição atrapalha a imagem internacional do Brasil. "Não tem sentido uma lei xenofóbica no século 21, na sociedade globalizada", afirma.
Para Plínio de Arruda Sampaio, presidente da Abra (Associação Brasileira de Reforma Agrária), a regulamentação é uma "necessidade urgente".
Segundo ele, o território é a "base" da soberania. "A compra de terras por estrangeiros no Brasil aumenta quando surge um problema de alimentação no mundo", diz. "E especuladores aproveitam a subida do preço da terra." Sampaio vê uma contradição dentro do próprio governo. "Ao mesmo tempo nosso presidente sai por aí a vender investimento em cana. É um contra-senso", afirma.
Ele defende a distinção legal entre empresa de capital nacional e estrangeiro. "O brasileiro não tem consciência de soberania, para preservar a nossa riqueza. Isso não é nacionalismo xenófobo, todos os países fazem. Tente comprar na França para ver a dificuldade. Aqui é a casa-da-mãe-joana."
Eduardo Viola diz que soberania nacional não tem relação com quem tem a posse da terra, mas com a aplicação de uma lei igual para todos. "Soberania nacional é Estado de Direito. O que estão tentando fazer é uma cortina de fumaça. A diferença não é o dono, mas quem cumpre a lei. Mas provavelmente a sociedade brasileira está madura para evitar essa medida xenófoba e sem sentido."
Equilíbrio
Francisco Carlos Teixeira da Silva, professor titular do Departamento de História da UFRJ e autor de "Historia da Agricultura Brasileira", diz que, antes de se debater a compra por estrangeiros, o governo precisa dar um passo anterior.
"Antes de se preocupar com propriedade dos estrangeiros, seria fundamental ter uma política clara de identificação da estrutura de posse e propriedade e terra no país", diz o professor, segundo quem o Incra não conhece a maior parte dos donos de terra no Brasil.
Silva defende um controle maior no caso de ONGs e empresas estrangeiras que tentam implantar políticas públicas. "Não falo de indivíduos que vêm comprar uma casa de praia ou plantar soja ou cana, mas de entidades de direito público internacional que tentam implantar política pública."
Para ele, ONGs que vêm atrás de terras deveriam fazer projetos conjuntos com técnicos brasileiros. "Ninguém, por exemplo, chega ao Egito dizendo que a pirâmide é dele e que vai levar os achados arqueológicos para o exterior. Mas no Egito é possível se associar."
Gilberto Dupas, coordenador do Grupo de Conjuntura Internacional da USP, diz que o ponto central é saber criar regras. "Primeiro porque há o problema da paridade e geração de precedentes. Regras estabelecidas aqui criam referência, por exemplo, para investimentos do Brasil na Bolívia e no Paraguai. E há muitos brasileiros que investem nesses países."
Ex-presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), João Grandino Rodas vê a necessidade de "equacionar". "Se aplicar uma soberania de uma forma absoluta, não vai ser possível equacionar problemas de distribuição de renda, porque não haverá investimento para isso", diz.
"O caminho são leis que sejam debatidas e feitas no Congresso. Retirar simplesmente um parecer pode ser rápido, mas serve como se fosse um doente que precisaria de cirurgia recebendo uma aspirina."
Folha de São Paulo A hora da Amazônia
Tecnologia e conservação deveriam nortear um novo modelo para desenvolver a região que ocupa metade do Brasil
O DESMATAMENTO da Amazônia, além de estar no fulcro da imagem brasileira no exterior, desperta repúdio generalizado na opinião pública nacional. Após cinco séculos de crescimento com dilapidação de capital natural, o país enfim se dá conta de que seu futuro depende de uma guinada na marcha sobre a floresta, "a ferro e fogo".
O desafio está não tanto em conciliar desenvolvimento com preservação ambiental, dicotomia ultrapassada, mas em casar sustentabilidade com tecnologia. Assim será possível reverter em benefício da população amazônica e do país, hoje e para futuras gerações, a exploração de um dos maiores acervos de recursos naturais estratégicos.
A virtual unanimidade em favor de preservar os mais de 80% de floresta amazônica remanescente, contudo, não implica clareza sobre os meios de realizar o objetivo. Cabe ao governo federal arbitrar os interesses em jogo. Com o momento adquirido pela questão amazônica, é hora de formular uma política ousada para a região que cobre mais da metade do Brasil.
Começa a esboçar-se algo próximo de um consenso quanto às linhas gerais de um programa que não se reduza a uma lista de obras. O primeiro obstáculo a superar é a reticência do presidente Lula em assumir um compromisso concreto com a progressiva redução do desmatamento.
Só uma tal meta de Estado, vinculada a prazo definido, porá termo à ambigüidade da política ambiental. Seria factível estabilizar a taxa de desmatamento, até 2015, no patamar máximo de 10 mil km2 anuais, próximo do que se obteve em 2007. Além disso, investir cerca de R$ 1,5 bilhão anual para recuperar 150 mil km2 em dez anos.
A soma é alta, mas compatível com a capacidade de financiamento do Estado brasileiro. Basta mencionar que a cada ano valores similares são lançados em multas ambientais nunca arrecadadas. Caberia priorizar sua cobrança, focalizando as de maior valor e potencial para produzir efeitos demonstrativos.
O nó górdio da destruição reside na questão fundiária. Apenas 4% das terras na região são áreas privadas com títulos validados; outros 43% correspondem a unidades de conservação e terras indígenas. Do restante, 1 milhão de km2 (21% do total) são áreas supostamente públicas, as quais urge mapear e inscrever no patrimônio da União.
Há ainda 1,6 milhão de km2 (32%) de terras alegadamente privadas. Estima-se que um terço -420 mil km2, o equivalente a meio Mato Grosso- seja de posses ilegais. O governo federal deveria regularizá-las, mas só até o limite de 500 hectares e contra pagamento, para não premiar a grilagem.
O zoneamento ecológico-econômico constitui ferramenta importante para disciplinar o uso da terra, mas é ilusório aguardar que abranja os 5 milhões de km2 da Amazônia Legal. Cumpre priorizar regiões onde avança a fronteira agrícola. Como princípio geral, impõe-se circunscrever a agricultura intensiva e a pecuária às áreas já desmatadas.
Do governo federal se exige ainda que aprofunde o uso do crédito como alavanca para forçar o cumprimento de mínimos padrões fundiários, ambientais e trabalhistas. Não faltam fontes como fundos constitucionais para fomentar atividades de extrativismo de baixo impacto. É urgente financiar mais estudos para conceder a exploração de florestas públicas à iniciativa privada.
A revolução amazônica dependerá também de forte influxo de conhecimento. O governo deveria encampar a proposta da Academia Brasileira de Ciências de investir R$ 30 bilhões até 2018 em pesquisa aplicada na região. O objetivo seria criar cadeias produtivas de alta tecnologia e elevado valor agregado, capazes de atrair capital privado.
O modelo de desenvolvimento para o trópico florestal ainda está por ser inventado. Mais que um fardo, isso representa para o país uma grande oportunidade
Folha de São Paulo Passagem aérea já subiu 11% neste ano
Reajuste até maio quase iguala toda a alta registrada no ano passado; escalada dos combustíveis desencadeou crise na aviação mundial
JANAINA LAGE
O preço das passagens aéreas já subiu 11,13% até maio. A alta em cinco meses já é praticamente igual ao aumento registrado em todo o ano passado, de 11,21%, segundo a FGV (Fundação Getulio Vargas). Para especialistas e representantes do Snea (Sindicato Nacional das Empresas Aéreas), o consumidor está sendo prejudicado pela alta do preço do petróleo, que desencadeou uma crise na aviação mundial.
Segundo André Braz, economista da FGV, apenas em maio os preços subiram 7,25%, influenciados pela proximidade das férias de julho -período de alta temporada no Brasil e de demanda aquecida em vôos para Europa e EUA. "Desde a metade de 2007, as empresas começaram a reajustar os preços com maior intensidade", diz. Os dados incluem passagens domésticas e internacionais.
Segundo o balanço da TAM, a tarifa média cobrada pela empresa no primeiro trimestre deste ano foi de R$ 256, ante R$ 240 no mesmo período de 2007, um aumento de 6,67%.
No caso da Gol, a tarifa média nos primeiros três meses do ano foi de R$ 241, bem próxima da informada pela TAM. Foi um aumento de 32% na comparação com o mesmo período de 2007, quando a tarifa média da companhia ficou em R$ 182,6.
O presidente do Snea, José Marcio Mollo, diz que a alta no preços dos bilhetes está ligada à escalada do petróleo, que impulsiona o preço do querosene de aviação. "No ano passado, o combustível subiu 12%. Neste ano já está 31% mais caro".
O avanço da cotação do petróleo está mudando a composição de custos das empresas. Anteontem, o preço do barril em Nova York alcançou US$ 138,54 e subiu 8,41%, a maior alta em um único dia. Mollo diz que o combustível já representa hoje de 40% a 45% do total de custos. Antes era cerca de 30%. Para ele, a alta de preços pode estar longe do fim.
Em nota, a Gol admite a possibilidade de efetuar reajustes nos bilhetes e diz que seu custo operacional subiu. "Se o atual cenário de alta do preço do petróleo permanecer, é possível que seja necessário aumentar os preços das passagens."
A TAM já havia divulgado em maio a previsão de um aumento no yield (preço pago por quilômetro transportado) de 7% no mercado doméstico e 5% em dólar nos vôos internacionais.
Impactos
Segundo André Castellini, da consultoria Bain & Company, os resultados mais fracos das empresas reduziram a margem de manobra para absorção de aumento nos custos. "O gasto com petróleo foi compensado em parte pela valorização do real. O mercado vai crescer menos neste ano do que o previsto, apesar do desempenho favorável da economia."
A TAM lucrou R$ 2,6 milhões no primeiro trimestre, resultado 95,7% menor do que o de igual período de 2007. A Gol registrou prejuízo de R$ 74,1 milhões nos três primeiros meses.
Para o consultor em aviação Paulo Bittencourt Sampaio, a estratégia da Gol foi correta ao rever operações, mas a devolução de aeronaves Boeing-767 também é um fator de pressão sobre os preços. "Enquanto não devolver esses aviões, vai precisar reforçar a receita", disse. A empresa anunciou que fará vôos extras para Paris até o fim de agosto. Segundo Sampaio, o cenário de crise deve reduzir o ritmo de expansão da TAM nos vôos internacionais. "Eles não vão abrir novos destinos neste ano, vão acrescentar freqüências a partir do Rio", disse.
Tomando os balanços das duas companhias, nota-se que o yield (indicador que mostra quanto cada passageiro paga por quilômetro voado) da Gol foi de R$ 0,2407 no primeiro trimestre do ano, maior do que o da TAM, de R$ 0,2323.
Especialistas citam a forte concentração do mercado como um aspecto que facilita o repasse de preços. Segundo a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), TAM e Gol representam mais de 80% do mercado doméstico. Em abril, a demanda no setor cresceu 6,9%. Nos vôos internacionais, a TAM responde por uma fatia de 72,45% do mercado. A análise não inclui a participação das empresas estrangeiras.
Para Marcelo Guaranys, diretor da Anac, concentração não explica tudo. "O importante é saber se as empresas têm condições de concorrência. No caso do Brasil, não há nada que indique que não tenham".
Folha de São Paulo Uruguai quer limitar brasileiro na fronteira
Preocupado com o avanço de brasileiros e argentinos, governo prepara um projeto para limitar venda de terras a estrangeiros
ADRIANA KÜCHLER
O governo do Uruguai anunciou há duas semanas que prepara um projeto de lei para limitar a venda de terras a estrangeiros, diante do avanço de brasileiros e argentinos.
O projeto estabelecerá uma área de fronteira que só poderá ser vendida a uruguaios. Mas os estrangeiros que já possuem terras ali não serão afetados, segundo o subsecretário do Ministério de Gado, Agricultura e Pesca, Andrés Berterreche.
A decisão foi divulgada dias depois de o prefeito da cidade de Rio Negro, Omar Lafluf, ter pedido ao presidente Tabaré Vázquez para "pôr um freio" na compra de terras por argentinos. A Federação Rural do Uruguai calcula que 35% do 1 milhão de terras cultiváveis do país pertencem aos argentinos.
Os uruguaios temem uma "sojização" de suas terras com o avanço dos produtores argentinos, que enfrentam restrições às exportações e acharam no Uruguai um local com menos riscos para plantar. Outra preocupação uruguaia é evitar o contrabando e garantir a qualidade do gado na fronteira com o Brasil. Segundo o subsecretário, há fazendeiros com terras dos dois lados da fronteira, o que facilita o deslocamento do gado de um país ao outro e traz riscos sanitários ao Uruguai.
O Uruguai deve repetir assim o que fez o Paraguai em 2005, que proibiu a venda de terras a estrangeiros numa faixa de 50 quilômetros da fronteira. O governo paraguaio diz que a regra não tem efeito retroativo.
Esse tipo de proibição também é adotado na Bolívia (50 km), no Peru (50 km), no Panamá (10 km) e no México (100 km). No Equador, os estrangeiros não podem adquirir terras nas zonas de segurança nacional. Na Guatemala, precisam de autorização para adquiri-las nas reservas territoriais. A Venezuela não permite a venda de terras devolutas a estrangeiros. No Brasil, o marco legal está em debate.
Na Argentina, não há uma lei nacional que regule a venda de terras a estrangeiros. Porém, a Província de Corrientes incluiu em sua nova Constituição, promulgada em 2007, a restrição à venda de terras tidas como estratégicas a estrangeiros sem residência permanente no país ou a sociedades formadas por capital estrangeiro. A lei gerou polêmica por contrariar a Constituição nacional. Segundo a Federação Agrária Argentina, cerca de 10% do território do país pertence a forasteiros.
Em 2002, a Federação e partidos de oposição fizeram uma campanha pela restrição à venda de terras, sem êxito. A reivindicação também existe no Chile, onde não há restrições e há forte presença estrangeira.
Folha de São Paulo Brasiguaios se armam para reforma de Lugo
Produtores rurais com origem brasileira contratam milícias para protegerem suas propriedades em território paraguaio
JOSÉ MASCHIO
A vitória do esquerdista Fernando Lugo na eleição presidencial do Paraguai e suas promessas de reformulação da estrutura fundiária criaram um clima de permanente tensão nos departamentos (Estados) agrícolas do país vizinho.
O cenário opõe entidades camponesas que aceleram o processo de arregimentação de sem-terra, com montagem de acampamentos e mobilização de 150 mil pessoas pelo país, e fazendeiros, muitos deles brasileiros, que montam milícias para defender suas terras.
A concentração de terras no Paraguai -quarto produtor mundial de soja, atrás dos EUA, Brasil e Argentina- é uma das maiores do continente.
Pesquisadores ligados à MCNOC (Mesa Coordenadora Nacional das Organizações Camponesas) apontam que 77% das terras agricultáveis estão nas mãos de 1% dos proprietários rurais e que 351 fazendeiros são donos de 9,7 milhões de hectares (área superior à de Santa Catarina).
Na outra ponta, 25% da população paraguaia, ou 1,5 milhão de pessoas, vive em situação de pobreza, entre as quais 400 mil agricultores sem-terra.
Nesse estado de ebulição que antecede a posse do ex-bispo, em agosto, as terras férteis do departamento de Alto Paraná aparecem como objeto de desejo dos camponeses pobres. Eles deixam suas áreas de origem e se concentram na região à espera de um lote da reforma agrária prometida por Lugo.
"Brasiguaios"
Em Alto Paraná está a maior concentração de "brasiguaios" (produtores brasileiros ou paraguaios de origem brasileira), grupo que responde por quase 60% da produção paraguaia de soja, estimada em 7 milhões de toneladas na última safra.
A maioria dos "brasiguaios" é de pequenos e médios produtores, com áreas de 50 a 200 hectares (o parque Ibirapuera, em São Paulo, tem 160 hectares). São filhos e remanescentes da colonização brasileira no leste paraguaio nos anos 1970, após o acordo para a construção da usina de Itaipu. Vêem a promessa de reforma agrária de Lugo com crescente apreensão.
Já os brasileiros com grandes extensões de terra no Paraguai resolveram se prevenir e se armar. A Folha visitou áreas nos municípios de Colonia Yguazu, Santa Rita, Naranjal, Santa Tereza del Monday e Santa Rosa del Monday. Em todos os locais foi possível ver guardas armados com escopetas e revólveres nas plantações de milho e trigo.
Aparecido Donizeti da Silva, 50, dono de 6.000 hectares entre Yguazu e Santa Rosa del Monday, é um dos que optaram pelas milícias armadas. Emprega ao menos 15 homens na defesa de sua terra. A tarefa é coordenada por Alfonso Roman Acosta, ex-sargento que já trabalhou na segurança do general Lino Oviedo, candidato derrotado na última eleição presidencial.
""Não sou contra a reforma agrária, só não quero invasão da minha propriedade", afirma Silva. Suas terras, onde diz produzir soja, milho e trigo, são visadas pela OLT (Organização Luta pela Terra), para a qual Silva é só "laranja" de Oviedo.
"O dono daquela área é o general Oviedo, e são terras fiscais", disse Francisco Rescaldi, 45, coordenador de um acampamento de 650 famílias da OLT em Colonia Yguazu. Terras fiscais são áreas federais, mas que foram distribuídas a amigos do ditador Alfredo Stroessner (1954-1989).
Silva nega. ""Comprei as terras há 13 anos, nem conhecia o general [Oviedo], de quem hoje sou amigo. As terras foram fiscalizadas três vezes, não existe problema documental." Silva tem mais 13,3 mil hectares na região do Chaco paraguaio, onde cria gado de corte.
Outro ponto de tensão entre os brasileiros é a possível aplicação de uma lei aprovada em 2005 e que proibiu brasileiros, argentinos e bolivianos de comprar terras em uma faixa de até 50 km da fronteira. O atual e o próximo governo paraguaio dizem, porém, que a regra não será retroativa.
"Garroteiros"
Para lideranças sem-terra, os fazendeiros estão ressuscitando uma criação da ditadura. ""Foi a época dos garroteiros, a polícia paramilitar de Stroessner, que hoje os fazendeiros estão revivendo", disse Miguel Angel Colman, 50, secretário de organização da OLT.
Segundo Colman, há 11 milhões de hectares de terras fiscais do Paraguai com a iniciativa privada. Ele disse que essa terra bastaria para assentar os 400 mil sem-terra paraguaios.
Dono de 50 mil hectares de terra em solo paraguaio, o empresário Bruno Boff, 51, disse estar tranqüilo com a posse de Lugo. ""Isso parece a época em que o Lula ia assumir pela primeira vez no Brasil. Se falava em reforma agrária, desapropriações, confisco, e nada disso ocorreu. Quem deve temer é quem tem terra com documentação irregular."
Folha de São Paulo Sarkozy visita Líbano e pede que facções se reconciliem
Francês é o 1º líder ocidental a ir a Beirute após eleição
O presidente da França, Nicolas Sarkozy, conclamou ontem os líderes das facções libanesas a se reconciliarem e, por meio do diálogo, construírem a paz. Sarkozy, à frente de uma grande delegação, visitou ontem Beirute por cinco horas, tornando-se o primeiro líder ocidental a visitar o país desde a eleição do presidente Michel Suleiman no mês passado.
A crise política libanesa refluiu um pouco após a celebração do acordo de Doha, mediado pelo Qatar, que pôs fim ao pior ciclo de violência sectária desde a guerra civil (1975-1990) e permitiu a eleição indireta do general Suleiman, que é cristão.
"O acordo de Doha melhorou a situação e levou à reconciliação nacional. O presidente Suleiman tem a responsabilidade de fazer com que essa reconciliação tenha êxito", disse Sarkozy no aeroporto de Beirute.
Sarkozy encontrou-se com Suleiman antes de um almoço servido no palácio presidencial ao qual compareceram os líderes das principais facções, incluindo o chefe do Hizbollah, misto de partido e milícia extremista xiita apoiada pela Síria e pelo Irã. "A parte dolorosa da crise já passou", disse Suleiman. "O acordo de Doha restabeleceu a estabilidade política no Líbano, o que nos encoraja a reavivar o papel das instituições constitucionais."
Sarkozy estava acompanhado do premiê, François Fillon, ministros e líderes dos principais partidos políticos franceses. Ele disse que a delegação "excepcional" refletia os fortes vínculos entre os dois países.
O ministro da Defesa da França, Herve Morin, visitou os 1.600 soldados franceses que integram as forças de paz da ONU no sul do Líbano.
O Líbano tornou-se independente da França em 1943, mas Paris mantém fortes ligações com o país, em especial com a comunidade cristã
Folha de São Paulo Alvo de disputas, VarigLog vive crise
Fundo americano diz que ex-sócios brasileiros deixaram empresa em situação precária; eles negam
Companhia atrasa salários e pagamentos a prestadoras de serviços e não deposita FGTS há um ano, afirm
MARINA GAZZONI
Dois anos após a compra da VarigLog, ex-subsidiária de cargas da Varig, o fundo americano Matlin Patterson diz que a empresa está se recuperando dos problemas financeiros que enfrentou decorrentes das disputas judiciais e administrativas do fundo com os sócios brasileiros afastados pela Justiça. Dois sindicatos da categoria e funcionários da empresa ouvidos pela Folha discordam. Para eles, a situação financeira da VarigLog ainda é precária.
A VarigLog está no centro das denúncias contra a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), acusada por ex-diretores da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) de ter pressionado pela aprovação de sua venda, apesar de alertas sobre a condição irregular da sociedade formada pelo fundo americano e os sócios brasileiros.
Os funcionários da VarigLog em Guarulhos paralisaram as atividades na madrugada de ontem. Segundo Raphael Moraes, um dos integrantes da Comissão Interna de Representantes dos Trabalhadores da VarigLog de Guarulhos, eles querem o fim da "seqüência de demissões" e o pagamento dos salários atrasados.
Moraes afirma que a empresa não deposita o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) dos trabalhadores desde junho do ano passado.
Os benefícios que a VarigLog se comprometeu a pagar aos trabalhadores que aderiram ao PDV (Programa de Demissão Voluntária) também não foram acertados, afirma Moraes.
Um dos funcionários que aderiram ao PDV foi o auxiliar de carga Reginaldo Ferreira, 28, que optou por sair da empresa em maio. Ele temia que a disputa entre os sócios sacrificasse os pagamentos dos trabalhadores e pensou que seria um bom negócio se demitir e receber benefícios trabalhistas.
Desempregado, Ferreira diz enfrentar dificuldades financeiras, pois, conforme relata, não recebeu os benefícios acertados. Segundo ele, a rescisão do contrato ainda não foi homologada e, por isso, não pode receber o seguro-desemprego.
Mesmo assim, ele afirma que não se arrepende da decisão. "Ao menos estou livre para procurar outra coisa."
De acordo com Moraes, cerca de 500 funcionários foram demitidos nas duas últimas semanas. Segundo o sindicato dos aeroviários, outros 266 foram dispensados entre outubro de 2007 e janeiro deste ano. A entidade também diz que a empresa anunciou corte de 856 aeroviários e 112 aeronautas para os próximos 12 meses. A VarigLog não dá informações sobre esses dados.
A ameaça da Anac de cassar a concessão da VarigLog também assustou os trabalhadores, diz o funcionário Ailton Gonçalves. "O governo não pode parar as operações. Os funcionários querem trabalhar."
Falta de pagamento
O sindicato dos aeroviários diz que é comum empresas prestadoras de serviços à VarigLog suspenderem a atividade por falta de pagamento. "Eles contratam, atrasam o pagamento e as prestadoras abandonam os postos. Eles [VarigLog] contratam outras e fazem tudo de novo." Moraes cita como exemplo a empresa que operava empilhadeiras em Guarulhos, que teria desistido por falta de pagamento. Segundo ele, hoje os próprios funcionários da VarigLog, que não são treinados para a função, operam os equipamentos.
O Matlin afirma que a VarigLog está melhor hoje do que quando assumiu a empresa, após o afastamento dos ex-sócios do fundo -Marco Antonio Audi, Marcos Haftel e Luiz Eduardo Gallo- por ordem judicial, em abril deste ano.
Na época, a empresa operava com apenas um avião, sem manutenção da frota e com contratos rescindidos por clientes, diz o Matlin. Segundo o fundo, hoje a VarigLog tem sete aviões em operação, e sua diretoria negocia com os sindicatos dos funcionários um processo de reestruturação da companhia.
Audi nega que a VarigLog esteja melhor hoje. Ele diz que, na gestão dos brasileiros, os empregos e os vôos internacionais foram mantidos. Segundo ele, quando o fundo dos EUA assumiu o comando, a empresa deixou de voar ao exterior e quase mil funcionários foram demitidos. "Desde que largamos a companhia, ela se reduziu a um quinto do seu tamanho."
Jornal do Brasil Estado foi o campeão de desmatamento de 1990 a 1995
Na última quinta-feira, o Brasil comemorou o dia da Mata Atlântica, mas, de acordo com fotos de satélites, a Mata Atlântica está reduzida a 7,26% do que existia originalmente e não há muito a celebrar. Elaborado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e pela Fundação SOS Mata Atlântica, o estudo indica aumento no ritmo de desmatamento nos dois últimos anos. Segundo Marcia Hirota, diretora da fundação, o Estado do Rio chegou a ser campeão de desmatamento entre 1990 e 1995, mas, nos últimos anos, o desmatamento diminuiu, na contramão do resto do país:
– Isto aconteceu por vários fatores. Claro que há o fator conscientização da população e dos governantes, mas também porque já não há muito mais a desmatar.
A fundação acompanha a degradação a cada cinco anos. Entre 1985 e 1990, o Estado perdeu 30.579 hectares. Nos cinco anos seguintes este número saltou para 140.372. Depois para 4.096 hectares e então para 630 hectares.
Prefeito satisfeito
Os números deixaram o prefeito Cesar Maia satisfeito. Segundo ele, é inegável a importância do programa de reflorestamento. Em seu ex-blog, Maia ressaltou que hoje a capital tem preservada 18,2 % do total das florestas de Mata Atlântica. O número informado pelo INPE para o Brasil todo é de 7%.
Considerado o bioma mais rico em biodiversidade do planeta, a Mata Atlântica representa hoje cerca de 15% do território nacional, englobando 17 estados brasileiros, onde vivem 62% da população, cerca de 110 milhões de pessoas. O que impressiona ainda mais é saber que cerca de 93% de sua formação original já foi devastada.
De acordo com Márcia, sete das nove maiores bacias hidrográficas brasileiras estão na Mata Atlântica. Delas saem água potável para cerca de 3,4 mil municípios. A fauna também é importante. Entre os animais mais conhecidos que habitam estas florestas estão o mico-leão-dourado, a onça-pintada, o bicho-preguiça e a capivara. São, ao todo, 261 espécies conhecidas de mamíferos, 1020 espécies de pássaros, 197 de répteis, 340 de anfíbios e 350 de peixes no bioma.
– A Mata Atlântica é de alta ocupação e bem fragmentada pelo país – explica Márcia. – Preservar este bioma é de fundamental importância para a manutenção de muitas espécies.
Jornal do Brasil Ministro prevê preços mais altos
Proposta é reduzir a carga tributártia e dar tratamento de choque para os alimentos
Ludmilla Totinick
O preço dos alimentos não deverá baixar e nos próximos anos deve aumentar ainda mais, estratificando uma crise mundial que, paradoxalmente, representa mais oportunidade para o Brasil, prevê o ministro da Agricultura, Pecuária e Pesca, Reinhold Stephanes. Em entrevista ao Jornal do Brasil Stephanes sugere, como saída para as classes menos favorecidas e mais prejudicadas nessa conjuntura, diminuir a tributação, aumentar subsídios ou distribuir cestas às pessoas de menor poder aquisitivo.
A alta dos alimentos vai durar muito tempo?
– A alta veio para ficar. Acredito que, nos próximos anos, teremos um patamar de preços mais alto ainda. Porém, a curto prazo, o preço de alguns produtos, como o arroz e o trigo, pode cair um pouco, e até se estabilizar num nível mais baixo que o atual, mas daqui a dois ou três anos haverá aumento maior ainda.
Que fatores motivaram esse aumento?
– O mundo continua crescendo, a renda aumentou e as populações da China, Índia, Rússia e Brasil estão comendo mais. Ao lado disso, o uso do milho para produzir etanol nos EUA também influenciou a alta dos preços, assim como o uso da canola, que está substituindo áreas de lavoura na Europa, e o de trigo para produzir etanol. Temos ainda as questões climáticas que começam a afetar a produção de alguns países. A Austrália é um grande exemplo. No Brasil, isso acontece no Rio Grande do Sul. Outro fator é a especulação com as commodities no mercado futuro. Esse quadro ajuda a manter a pressão sobre os preços. Em resumo, sempre fomos um mundo de oferta de produtos agrícolas e, hoje, passamos a ser um mundo de demanda aquecida, que continuará assim por muito tempo.
O Brasil sempre foi considerado o celeiro do mundo. Temos de nos preocupar com a grande demanda?
– O Brasil é um dos poucos países do mundo que consegue produzir para atender a toda a demanda interna e seu aumento. Também produz energia limpa por meio do etanol, além de ser o país que mais cresce no mundo em produção de excedentes. Veja bem, não é o que mais tem excedentes, e sim o que mais cresce na produção de excedentes no mercado mundial. As perspectivas são positivas para o futuro, ou seja, de continuar aumentando a produção. Não temos de nos preocupar, pois o Brasil ocupa uma situação privilegiada, o fenômeno que está acontecendo no mundo é uma oportunidade para o Brasil.
Como pode ser uma boa oportunidade?
–No caso dos alimentos, a inflação é importada, pois os preços são formados em bolsas de mercadorias para o mundo, com exceção do preço do feijão, que é estabelecido no Brasil. O arroz, apesar de não ser commodity, sofre influência externa e interna. Portanto, o Brasil sofre igualmente as mesmas pressões que todos os outros países. A boa notícia é que a inflação dos produtos agrícolas no Brasil está sendo menor do que nas estas outras nações. A média brasileira é menos da metade da inflação que ali é registrada.
O custo da produção brasileira é realmente um dos mais baixos do mundo?
–De forma geral o custo é mais baixo. O custo da carne brasileira é um dos menores do mundo, sendo que a Argentina está quase encostando no Brasil. Na União Européia, o custo é três vezes maior e, nos Estados Unidos, é 50% maior. Também temos os melhores preços na soja, no etanol.
O país é beneficiado ou prejudicado pelo baixo custo da produção?
– Dentro da porteira, somos beneficiados, pois nos dá mais competitividade no mercado mundial. Tanto que conseguimos competir com as agriculturas subsidiadas dos EUA e União Européia, sem falar nas barreiras de importação impostas aos nossos produtos em alguns países. Se os subsídios caírem nessas regiões e as barreiras diminuírem, a renda do nosso agricultor aumentará, pois ele perde grande parte dela ao transferir seus ganhos aos países importadores. Somos muito eficientes dentro da porteira, mas, quando saímos, devido à logística, ao transporte, nosso produto encarece.
O senhor se refere à falta de infra-estrutura?
– Sim. Enfrentamos problemas para levar um produto do Mato Grosso até os portos de Paranaguá ou Santos. O custo aumenta e o agricultor perde renda, com o custo do transporte e logística.
Há desperdício devido ao transporte?
– Claro que se perde, embora exista muita controvérsia em relação à estatística. Tem gente que diz que são 2%, outros dizem que são 5%, 10%, mas acredito que há exageros. Ninguém consegue saber qual é a estatística correta. Há uma perda evidente, mas não se consegue medi-la de forma efetiva.
O que mais prejudica o setor?
– Devido à alta das matérias-primas no mundo, o custo dos adubos aumentou muito, e o país se prejudica, pois importa quase 70% dos adubos. É uma questão grave para o Brasil, pois, estrategicamente, a agricultura é altamente eficiente, mas é altamente dependente da importação de insumos, que aumentaram muito ultimamente, devido à alta do petróleo. São gastos com adubo 40% do custo da produção da soja.
Os alimentos são a parte mais significativa no orçamento das famílias de baixa renda, o poder de compra do salário caiu. O governo adotará medidas para impedir o agravamento das desigualdades sociais?
– É um pouco difícil fazer isso. Pode-se diminuir as alíquotas naqueles poucos tributos que ainda existem em relação à cesta básica, como acabou de ser feito com o trigo. Também pode-se incentivar o aumento de produção, porque uma das formas de contribuir para que não haja uma alta muito forte é aumentando a produção, apesar de a inflação nos preços dos alimentos ser importada. Ou aumentar o subsídio para as classes menos favorecidas.
E como estão as exportações brasileiras?
– Há oito anos, é o país que mais cresce no mundo em excedentes para exportação. Na União Européia, o crescimento da taxa anual de exportação é 8%, nos EUA são 10%, no Brasil são 16%. Em 2007, exportamos US$ 60 bilhões em produtos agrícolas. Tivemos saldo na balança comercial de US$ 50 bilhões, ou seja, a agricultura ainda pagou US$ 10 bilhões do déficit dos outros setores, como o industrial.
"Sou contra a tributação de alimentos"
O que senhor acha de um país com milhares de famintos tributar alimentos?
– Sou totalmente contra a tributação de alimentos. Não podemos incorrer num erro que a Argentina está incorrendo ou repetir um erro do passado. É preciso incentivar maior produção, além de criar renda para que as pessoas possam se habilitar ao mercado e obter, ou até, se for o caso, subsidiar renda através da Conab ou distribuir cestas às pessoas que não têm condições de adquirir.
A alta dos alimentos é uma correção histórica de preços, que por muitos e muitos anos baixaram constantemente?
– Sempre fomos um mundo de oferta de produtos. O excesso nos últimos 30 anos, sempre puxou a inflação para baixo, então o que se ganhava em eficiência, em tecnologia e produtividade era em sua grande maioria transferido para a mesa do consumidor, ou seja, diminuindo os preços relativos no mercado. Só que, de dois anos para cá, houve a inversão dessa curva, há uma recuperação dos preços.
O Ministério da Agricultura anunciou que estuda preço mínimo para produtos extrativistas com a finalidade de garantir os agricultores mesmo nas oscilações de mercado. Como o sistema vai funcionar?
– Na minha área são quatro produtos, com tratamentos diferentes. O feijão é um produto tipicamente brasileiro, o Brasil consome mais de 75% de feijão, que é o feijão a cores, e é esse que sempre causa impacto no mercado. Quando há excesso de produção, o preço chega a cair a R$ 50 a saca. Aí, deixa-se de produzir e o preço chega a R$ 200, até R$ 250 a saca, ou seja, a volatilidade é muito grande. Não temos como armazenar o feijão pelas suas características, é um produto de ciclo curto, de 90 dias. Ou seja, pode-se ter quatro safras por ano, três em determinadas regiões e mais uma em regiões diferentes. A idéia é criar uma política específica para o feijão, fundamentalmente baseada em crédito, em seguro e em um preço de garantia. Não seriam R$ 200 nem R$ 40 nem R$ 50, mas algo em torno de R$ 80 a R$ 90 para estimular a produção do produto. Quando houver redução muito grande do preço, esse valor seria mantido pelo governo para evitar recessão na safra seguinte. Com relação ao arroz, o Brasil é auto-suficiente, poderia haver uma política para controlar o preço interno, que aqui subiu só 35%, mas mais de 100% no mundo. Em relação ao milho, não conseguimos estabelecer uma política, há um estudo. Temos produção suficiente, excedentes para a exportação, mas, por outro lado, ele serve de base para produção de nossa carne de frango, produção de leite, suinocultura, e também gera centenas de subprodutos na indústria. É uma matéria-prima cuja produção deve ser incentivada. O trigo é um outro produto que tem uma característica diferente: o Brasil já foi auto-suficiente em trigo, deixou de ser por uma política interna, considerando que o trigo que vinha da Argentina era mais barato, e que os Estados Unidos e Canadá subsidiavam a exportação. Assim, era melhor importar o trigo do que produzir, porque havia certo risco e os custos de produção eram relativamente altos. Os altos preços do trigo no mercado internacional deverão se manter em patamares elevados nos próximos anos. Por isso, é lucrativo para o Brasil voltar a ser auto-suficiente em trigo. Devemos aumentar a produção na próxima safra em pelo menos 20%, e, em cinco anos, nos tornaremos auto-suficientes para evitar impactos dos preços externos dentro do mercado brasileiro.
Quais são os pontos fortes e fracos da agricultura brasileira?
– Os pontos fortes são a terra, clima, água e o agricultor. Os nossos agricultores – italiano, alemão, japonês e holandês – já eram agricultores nos países de origem e chegaram ao Brasil com conhecimento e tecnologia. Também temos a melhor tecnologia tropical do mundo em agricultura e instituições fantásticas em termos de pesquisa.
O pontos negativos ainda são a infra-estrutura insuficiente, logística, aí os portos, cabotagem e algumas questões ambientais que são tratadas com falta de racionalidade, além da grande fragilidade com relação aos adubos e os defensivos.
Há denúncias de trabalho escravo em canaviais e de desrespeito ambiental cometidos pelas usinas. Foi feito algo para enfrentar essa questão?
– É um problema de Brasil. Ninguém pode admitir o trabalho escravo. A maioria das indústrias, 80%, respeitam as leis trabalhistas. Temos desvios, por isso o governo estuda estabelecer o selo social, que irá caracterizar as usinas que produzem dentro das boas práticas. Desvios evidentemente têm de ser punidos dentro do rigor da lei.
Como o ministério defende a bandeira de que o etanol brasileiro é um combustível limpo?
– Para cada unidade de energia que uso para produzir etanol, tenho nove unidades de energia limpa. Já com o milho, nos EUA, para cada unidade de energia suja que se usa uso, obtém-se, no máximo, 1,5 de energia limpa. Segundo, o balanço entre emissão e seqüestro de CO2 é altamente positivo quando se produz via cana-de-açúcar. É um produto competitivo, ganha da gasolina sem ter qualquer subsídio. Produzir etanol à base de cana é mais barato que produzir gasolina. Ocupa 2% da agricultura brasileira. Na pecuária, usamos 200 milhões de hectares, para produzir álcool precisamos de 3,5 milhões de hectares. Crescemos na produção de etanol onde temos área sobrando.
Jornal do Brasil Petrobras vai contratar 11 mil empregados no Estado do Rio
Encomendas da estatal abrem novas perspectivas de vagas
Leda Rosa
Embalada pelas encomendas da Petrobras, a indústria naval fluminense investe nas contratações e volta a ter importância no mercado de recursos humanos, atraindo rapazes e moças para o primeiro emprego com sólidas perspectivas.
A indústria naval voltou a ser um dos maiores balcões de emprego no Estado. Os estaleiros, aquecidos pelos sucessivos pedidos de embarcações e plataformas da Petrobras Transporte (Transpetro), estão de portas abertas para os trabalhadores, especialmente jovens recém-saídos de cursos profissionalizantes.
A demanda é tanta que algumas profissões já estão em falta. E, as perspectivas para os próximos anos são igualmente positivas, com criação de mais 11 mil empregos.
O Rio de Janeiro é o principal pólo da indústria naval brasileira, ramo que emprega 40 mil trabalhadores no país. De cada dez empregados diretamente pelo setor, sete estão em solo fluminense, formando uma população de 28 mil funcionários, concentrados em Niterói, Angra dos Reis e no Rio.
Dois novos pólos estão em implantação e devem alterar, em alguns anos, este cenário: no Nordeste, o estaleiro Atlântico Sul, em Suape (PE), e no Sul, o estaleiro Rio Grande, na cidade homônima (RS).
Com o resgate da capacidade produtiva dos estaleiros, capitaneada pela Transpetro a partir de 1998 – depois de 15 anos de sucateamento do parque naval – os postos de trabalho aumentam continuamente. Segundo a Fundação Cide, a recuperação do setor naval, que tinha uma representação irrisória na indústria do Estado do Rio de Janeiro, de 0,3% em 1998, passou para 2,8% em 2004. No período, o setor obteve uma expansão de 50% no valor da produção e de 558% no número de empregos.
Apenas em 2007, os estaleiros do Estado tinham em carteira 39 encomendas, de embarcações para a Petrobras, PDVSA (empresa estatal venezuelana de petróleo) e Log-In (empresa de logística da Vale). E no final de maio deste ano, o presidente Lula foi até o Estaleiro Mauá, em Niterói, o mais antigo do país, com 162 anos de existência, e anunciou a encomenda de novas 146 unidades de apoio à exploração e produção marítima de petróleo.
O Rio de Janeiro é um dos principais beneficiados pela retomada desta indústria. Em seus estaleiros será fabricada a metade das 26 embarcações de grande porte que irão renovar a frota da Transpetro. Segundo o governo federal, o pedido garante quatro anos de plena atividade aos estaleiros nacionais.
– O navio é o melhor produto para a perenidade da indústria naval. As plataformas chegam a contar com 8 mil trabalhadores no pico da construção, mas quando o trabalho termina, 90% do pessoal é demitido – diz Maurício Ramos, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro e da Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB),
Até meados de 2009, o meio sindical do Rio prevê crescimento de 75% da base, que hoje tem pouco mais de 4 mil trabalhadores cariocas, com a contratação de mais 3 mil empregados. As novas embarcações estão obrigadas a utilizar entre 70% e 80% de mão-de-obra e conteúdo nacional.
A medida reforça o mercado de trabalho indireto, representado pela indústria de componentes como maçanetas, vidros e mobiliário. Os pedidos da Petrobras somam um pacote com mais de 2 mil itens para diferentes setores da economia.
Para o presidente do Estaleiro Mauá, Domingos D'Arco, a indústria naval vive o momento mais importante dos últimos 20 anos.
– É a hora onde as oportunidades propiciadas pela abertura de novas fronteiras, como os reservatórios de óleo e gás no pré-sal, impõem uma resposta decidida por parte da indústria para atender aos desafios tecnológicos e econômicos. Nós, do Mauá, estamos nos preparando para atender às encomendas que virão.
Domingos D'Arco lembra que há investimentos na formação de mão-de-obra.
– Exemplo disso são os altos índices de aprovação das turmas de soldadores formadas dentro de nossa casa – diz, referindo-se ao Programa de Qualificação Profissional de Soldadores, iniciativa que atingiu percentual de aproveitamento de 93% na turma de 84 funcionários candidatos aos postos de soldador.
A função é uma das maiores lacunas do mercado naval. Outros profissionais em falta para os estaleiros fluminenses são caldeireiro, encanador e maçariqueiro. Essa escassez alavancou a carreira de Luiz Claudio Bitencourt, de 26 anos, funcionário do Mauá. Em 2001, ele entrou no estaleiro como ajudante e, três anos depois, aprendeu o novo ofício e completou o ensino fundamental. Logo conseguiu o cargo de maçariqueiro.
– A procura pela mão-de-obra qualificada é muito solicitada, a melhor coisa para quem quer entrar é fazer um curso profissionalizante – diz ele, que está terminando o ensino médio em uma unidade do Sesi dentro do estaleiro. – Há dois anos, quando entrei no Mauá, estava desempregado, numa condição muito ruim. Era noivo, mas não podia pensar em casar. Foi dentro da construção naval que minha vida mudou – diz ele, que, depois da carteira assinada, casou, comprou casa e é pai de duas crianças.
Jornal do Brasil Inteligência chavista é versão militarizada de antiterrorismo
Com a justificativa de conter o imperialismo americano, o sistema de inteligência de Hugo Chávez, prolonga, com as particularidades que lhe são inerentes, a Lei Patriota aprovada pelos EUA no pós-11 de Setembro. Neste caso, terroristas são os antichavistas, estejam eles na Venezuela ou em Miami.
Analisado de outro viés, a inteligência de Chávez se pauta pelos Comitês de Defesa da Revolução de Cuba, que têm no delator sua figura central e cujos agentes dão aula a venezuelanos. Na versão chavista, porém, a delação ultrapassa o território nacional.
– O imperialismo ativou um conjunto, não sabemos quantos, de centros de operações e de planificação estratégica que trabalham 24 horas por dia – justificou Chávez.
Excepcionalidade
"Em tempos de terrorismo, qual é o país que não pensa em inteligência?", desafia Leandro Area:
– Isto é normal. Mas a lei não causaria tanta polêmica se fôssemos um país democrático. O ministro do Interior é um guerrilheiro.
Além disso, o decreto foi instituído por meio da Lei habilitante, um recurso especial do Executivo que permite ao governo legislar sobre matérias de urgência.
– Não é, nem de longe, o caso desta inteligência. A Lei Habilitante é para emergências econômicas, não para Chávez legislar. É inconstitucional – crava Carlos Correa.
A "única legislação na história parecida a esta de Chávez foi o Decreto de Defesa do Povo e do Estado, do Terceiro Reich alemão", compara Vladimir Gessen:
– Se o espírito desta era caçar judeus, a nossa é caçar os próprios venezuelanos, também tachados de inimigos do Estado. É uma medida política porque Chávez se sente cada vez mais desesperado e próximo do nacionalismo do Terceiro Reich.
A militarização da sociedade se inicia no auto-denominado "comandante-presidente", diz Area:
– O sistema é apenas o reflexo de sua mentalidade invasiva e intimidadora, é como se estivéssemos diante de um fascismo. Radicalizar o espírito da lei é típico de um governo invasivo que quer fazer crer que a sociedade está dividida entre chavistas e antichavistas.
Jornal do Brasil Delator guia sociedade de controle
Sistema de inteligência decretado por Chávez obriga cidadãos a entregar informação sensível
Camila Arêas
Por meio de um decreto-lei publicado, sem aviso prévio, no diário oficial dia 28, o presidente Hugo Chávez criou um Sistema Nacional de Inteligência e Contra-inteligência que transforma a Venezuela em uma sociedade de delatores. Todo cidadão, dentro ou fora do país, está obrigado a repassar ao Executivo informações relevantes para a segurança estratégica do Estado. Duras sanções são impostas para divulgação não-autorizada de dados sensíveis. Agentes de inteligência têm poder para deter "potenciais inimigos do governo" sem ordem judicial.
A lei foi aprovada em reação à potencial ameaça de uma invasão americana. Oposicionistas classificam o sistema como terrorismo interno. Sua aplicabilidade, porém, é questionada por analistas, que vêem a fraqueza do presidente como justificativa e cova do decreto.
Chávez está "criminalizando a dissidência, passo clássico das ditaduras fascistas", diz Vladimir Gessen, analista e ex-político venezuelano:
– Não se trata de um sistema de inteligência, este já existe, trata-se de amedrontamento do povo. Não se está mudando o aparato policial, a estrutura segue idêntica, o diretor de inteligência é o mesmo, e arbitrariedades já são cometidas contra generais críticos. A diferença fundamental deste decreto é que incorpora a obrigatoriedade da delação.
Sapo
A figura do delator, chamado no país de "sapo", pela boca grande, tem associação direta com a ditadura.
– A denominação é insulto nacional, tem uma conotação social horripilante – lembra o cientista político Leandro Area.
"As normas são de obrigatório cumprimento para toda pessoa que no desenvolvimento de suas atividades dentro ou fora do território nacional possua ou tenha acesso à informação de interesse estratégico para a nação", nestes termos o artigo 2 do novo decreto obriga a colaboração de estrangeiros.
– Se um brasileiro tiver uma informação relevante para a segurança venezuelana e não quiser repassá-la, pode ser condenado pela Justiça venezuelana – ilustra Gessen. – É ridículo, passa por cima do direito internacional de forma unilateral. Se coloca acima das Constituições de outros países. É inaplicável.
Carlos Correa, analista da Universidade Católica Andrés Bello, ressalta a definição, "muito generalizada", do que se entende por "interesse estratégico à nação":
– Pode ser aplicável a qualquer coisa. No caso dos jornalistas, passa por cima do sigilo profissional. Afeta diretamente o acesso à informação pública e, por outro lado, veta nossa possibilidade de pedir um habeas data. São imposições ambiciosas, sem qualquer respeito à privacidade.
Entre os "órgãos de apoio" do sistema estão "pessoas naturais e jurídicas, de direito público ou privado, nacionais ou estrangeiras, assim como órgãos e entes da administração pública nacional, estadual, municipal, redes sociais, organizações populares e comunidades organizadas, quando seja solicitada sua cooperação para obtenção de informação ou apoio técnico".
– Trata-se de submeter os cidadãos a funcionários do governo, concentrando poder a partir da lógica da conspiração – resume Correa.
Rede de espias
"Os funcionários do novo sistema deverão estar ideologicamente alinhados com a revolução", explicitou o ministro do Interior e da Justiça, Rodríguez Chacín.
O funcionalismo público "não ascende na hierarquia se não têm parte no esquema", conta Area:
– O governo tem listas de todos que votaram contra Chávez. Há muita vingança política, com demissões e perseguições.
A lei outorga ao governo amplo poder não apenas para gravar conversas telefônicas, filmar e fotografar atividades ou pessoas suspeitas, como ainda para "antecipar" delitos e deter os responsáveis que atentem contra a estabilidade e soberania do país.
O processo de formação de provas "é incontrolável", diz Correa:
– As conversas da oposição já são gravadas hoje. No entanto, agora terão valor de prova, mesmo sem prévia demanda judicial.
O sistema estabelece que pode manter sob segredo uma informação acusatória cuja divulgação poderia afetar a segurança do Estado, com restrições ao acesso dos advogados ao expediente contra o acusado.
– Se você perguntar por que está sendo levado preso, vão dizer que é segredo. Se perguntar na prisão, de novo, é segredo. Então, chegará ao cúmulo do réu ir ao tribunal sem conhecer a acusação. O advogado não pode trabalhar e o juiz, divulgar as provas. Surreal – reage Gessen.
A não cooperação com o governo implica penas de quatro anos para os cidadãos comuns e de até 10 para funcionários públicos.
Jornal do Brasil Desafios às relações latino-americanas
Diplomata vê em países da Alba pontos de maior conflito no continente e elogia a posição discreta de Cuba, que passa por uma ‘glasnost’ com Raúl Castro
Marsílea Gombata
A admiração pela diplomacia brasileira não suaviza as críticas de um dos maiores diplomatas venezuelanos. Milos Alcalay, ex-embaixador da Venezuela nas Nações Unidas e no Brasil (1997-2000), é um lúcido opositor a Chávez, que reconhece no líder venezuelano o dom de "encantar" interlocutores e se adaptar a setores quase opostos.
Ao analisar riscos atuais à democracia no continente – como o plano de inteligência venezuelano – Alcalay vê com preocupação posições como a de Lula quando afirmou que "Chávez tem sido o melhor presidente da Venezuela" nos últimos 100 anos e acredita que se essa for a tendência seguida, Lula pode ser considerado o pior presidente do Brasil em 100 anos.
Como o senhor avalia a criação de uma aliança militar sul-americana?
Depois de uma década de tentativas falidas para uma organização militar do Atlântico Sul que enfrentasse o "imperialismo americano", não creio que a proposta brasileira de cooperação através da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) seja uma forma de enfrentar os Estados Unidos. Apesar de os EUA não fazerem parte da aliança, Nelson Jobim tem mantido contato com Washington para assegurar que o plano não obedece à estratégia de confrontação aos americanos. Essa aliança parece buscar mecanismos de contenção frente à carreira armamentista que iniciaram países como a Venezuela. E busca mecanismos de prevenção para evitar conflitos, como os na fronteira entre Colômbia e Equador.
No caso da Unasul, é oportuno pensar em um novo bloco quando o Mercosul e a Comunidade Andina não funcionam como o esperado?
A Unasul nasce da proposta do ex-presidente Fernando Henrique, quando em 2000 reuniu chefes de Estado para explicar seus eixos. A premissa é integrar a Comunidade Andina de Nações e o Mercosul, incorporando países da Comunidade do Caribe, e não substituir.
O papel de liderança depositado no Brasil pela comunidade internacional pode acarretar reações em países vizinhos?
Henry Kissinger definiu com acerto o papel de liderança do Brasil ao dizer: "Para onde se inclina o Brasil, vai se inclinar o resto da América Latina". O Itamaraty tem levado com prudência e tato o peso de seu próprio porte por meio de uma diplomacia de Estado discreta e ao mesmo tempo firme, com a qual tem dado garantias a seus vizinhos, a ponto de a maioria reconhecer e apoiar o Brasil ao posto de membro permanente no Conselho de Segurança da ONU. Mas vejo com preocupação posições que escapam à tal prudência e se alinham a uma visão partidária, como quando Lula afirma que "Chávez tem sido o melhor presidente da Venezuela" dos últimos 100 anos. Essas afirmações demonstram que, se esse caminho for seguido, Lula poderia ser considerado como o pior presidente do Brasil em 100 anos de diplomacia, levando em conta posições mais de partido que Estado.
Quais são as maiores ameaças ao continente atualmente?
Os pontos de maior conflito são países vinculados à Alternativa Bolivariana para as Américas (Alba); Venezuela, com sua corrida armamentista, Bolívia e tensões geradas com o processo de autonomia; Nicarágua, com o modelo de revisão sandinista; Equador, com denúncias que derivam dos computadores das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Paradoxalmente, Cuba, que foi expulsa da OEA, é o país da Alba que tem tido posições mais discretas, e Raúl Castro parece iniciar uma glasnost à cubana.
Como avalia a realidade da Bolívia? O governo de Evo Morales é diferente do de Chávez?
Mais do que influenciar, a Venezuela intervém diretamente nos assuntos bolivianos. Se Evo se nega a dialogar com setores não identificados com o projeto socialista, corre-se riscos de desestabilização onde a oposição é majoritária.
As Farc estão perdendo força? Quais serão as conseqüências disso?
As Farc estão em debandada e se persistir sua opção de poder pela via militar, não há futuro para um protagonismo viável. É impossível a tomada de poder pelas armas, porque não têm respaldo da população colombiana e Uribe representa a condução de um Estado de direito. Pela primeira vez em meio século de violência, é o momento de buscar uma resposta política de pacificação, tal como se conseguiu na Colômbia com o M19, ou na Venezuela com a política executada pelo presidente Caldera, que permitiu incorporar à vida democrática antigos guerrilheiros como Pompeyo Marquez ou Teodoro Petkoff, fundador do jornal Tal Cual.
Qual o caminho adequado para negociar com o grupo?
O dilema dos novos dirigentes das Farc é optar entre a negociação e a continuação da via armada. A liberação de Ingrid, que inicialmente foi usada como arma contra Uribe, tem sido como um bumerangue para as Farc, já que mostram o verdadeiro rosto inumano dos seqüestradores, que durante anos mantêm sob as piores condições seus reféns.
Como o governo da Venzuela trata seus cidadãos seqüestrados pelas Farc?
Tem negado a existência de reféns venezuelanos, o que tem gerado profundas críticas.
Há traços de inconstitucionalidade na gestão Chávez ou isso é exagero da oposição, que não reconhece a força social do governante?
Chávez maneja bem a agenda social. Mas não tem sabido gerenciar com transparência a inclusão de todos os setores do país. Assim, tem impedido a realização prática dessa agenda apesar da imensa riqueza proveniente do petróleo, que deveria tê-lo permitido erradicar a pobreza. A imposição de um poderoso presidencialismo tem esmagado não apenas o Judiciário, o Legislativo e a moral, mas também partidos, sindicatos, empresários, ONGs, meios de comunicação. Não se trata de solução eleitoral, mas política. É necessário reconstruir o diálogo para estratégia de salvação nacional.
Haverá mudanças a médio prazo na Venezuela?
Não há processos irreversíveis. O modelo autoritário se esgota. Há um gradual avanço que se evidenciará se a unidade dos partidos para as eleições de 23 de novembro se consolidar. Parecem cruciais fatores como o movimento universitário e o rechaço ao modelo autoritário.
Como analisa o papel de Chávez na região?
Seguidores de Chávez repetem o refrão que caracteriza seu desejo: "A espada de Bolívar pela América Latina". Pode ser uma alternativa caso se repita em outros países modelos como o de Evo na Bolívia, Ortega na Nicarágua e Correa no Equador. Governos opositores devem impor opção de progresso social por perspectiva democrática e recusar a "espada", por causa do cumprimento de acordos de direitos humanos.
Como analisa o recente sistema de inteligência e contra-inteligência lançado por Chávez? A defesa contra os EUA é a real motivação?
Preocupo-me pois é o mais descarado plano de esmagar a dissidência, muito similar às normas da Alemanha nazista ou da Rússia stalinista. A comunidade democrática internacional não pode aceitar esse "diktat" votado por um decreto-lei que sequer foi apresentado à Assembléia Nacional. O antiamericanismo é somente verbal, porque a balança comercial Venezuela-EUA ascende a US$ 50 milhões.
Há traços nessa lei que lembram medidas antiterror pós-11 de Setembro?
Sim. A imposição de um modelo autoritário avança cada vez mais. O modelo militarista bolivariano, com crescimento de um socialismo híbrido e superado historicamente, retrai-se a regimes que no passado significaram atentado contra as liberdades. É um risco além das fronteiras, já que a pretensão é exportar o modelo bolivariano.
Em 2004, o senhor renunciou ao posto de embaixador na ONU. Na época, dizia-se muito comovido com os acontecimentos de seu país, que passava por intensa crise política, e via a renúncia como única opção. Como foi esse processo e o que mudou desde aquele ano?
Em 27 de fevereiro de 2004, percebi que haviam violado três princípios fundamentais que me fizeram optar pela atividade diplomática durante 34 anos. A vigência dos direitos humanos, que se violou com a repressão de 2004. A democracia, com a manipulação do referendo e o surgimento de um apartheid político. E a política externa, com o descumprimento das regras da diplomacia, por uma confrontação grosseira com outros chefes de Estado. Posições em relação a esse temas têm se radicalizado.
Como é ser embaixador de Chávez? Como é o presidente venezuelano nos bastidores?
Fui embaixador de Chávez além de ser diplomata em outros nove governos anteriores. Devo reconhecer sua capacidade como encantador natural. Tem um extraordinário olfato político e sabe como agradar e conquistar as primeiras páginas da imprensa mundial. É muito versátil: sabe se adaptar extraordinariamente ao seu interlocutor do momento. Assim, vemo-lo como defensor da empresa privada, quando se reúne com a Fiesp. É um revolucionário quando se encontra com o MST. É aliado do Irã quando está com Mahmoud Ahmadinejad. Em um dia se reúne com alguns chefes de Estado e no dia seguinte os critica sem o mínimo rubor.
O senhor se considera antichavista?
Não sou antichavista, sou democrata.
Jornal do Brasil Al Gore desmente declarações sobre Amazônia
Al Gore, o ex-vice-presidente dos Estados Unidos, é ecologista de respeito. As pessoas prestam atenção especial em suas ações. Por isso, a frase atribuída a ele: "Os brasileiros pensam que a Amazônia é deles. Não é. Ela pertence a todos nós" (de 1989) tem causado frisson entre brasileiros e ecologistas internacionais. O correspondente do JB em Nova York perguntou ao ex-vice presidente americano o que exatamente ele estaria sugerindo.
– Em primeiro lugar, a frase veio dentro de um contexto longo e que não pode ser abreviado sem perder o sentido original. O que eu sempre disse é que a Amazônia– não apenas no território brasileiro – é um ecossistema de importância fundamental para a humanidade – disse Gore. – Ela não beneficia apenas o Brasil. A soberania dos países que contém parte da Amazônia em seu território está legitimada em acordos internacionais – e os Estados Unidos foram dos primeiros países a dar este reconhecimento. Não contesto a soberania de cada nação da região.
Só ajuda
O ex-vice-presidente completou que o que propõe é ajudar, com idéias e recursos, a preservação desta riqueza ecológica.
– Eu disse nas vezes que estive no Brasil – inclusive em encontro com a ex-ministra do meio-ambiente Marina Silva – que daria meu apoio às idéias que provocassem soluções na preservação da floresta. Ressaltei na ocasião, outubro de 2007, que estudaria propostas brasileiras para a preservação, e daria forte apoio às melhores idéias. Não proponho invadir a Amazônia – disse Gore.
As soluções eficientes, porém, nem sempre estão ao alcance do ex-prêmio Nobel da Paz em 2007. Às vezes, ele se contenta com pouco. Por exemplo: até o ano de 2006, Al Gore, gastava de eletricidade em sua residência de Nashville, no Tennessee, 221 mil quilowatts-hora por mês. Eram contas de luz no patamar de US$ 1.359,00. Para se ter uma noção do que isso representa, pegue-se o consumo médio americano: 10.656 kwh (o maior nível do mundo). Depois de receber o Nobel e um Oscar, por sua participação no filme ecológico Uma Verdade Inconveniente, a mansão dos Gore passou por reforma. Reduziu-se em 11% o esbanjamento de energia. Isso significa que o dispêndio agora é de 198.800 kwh: pouco mais de 18 vezes maior do que de seus compatriotas.
Com painéis solares, os Gore conseguem economizar na conta de luz. Foi a solução que o patriarca da família achou a mais razoável para resolver a questão. Mesmo que, para muita gente do Tennessee, esta resolução tenha efeito um tanto minguado e esteja além das posses do cidadão comum. Painéis solares custam fortunas.
Faltam, porém, idéias efetivas – de Al Gore ou de outros – para interromper o desmatamento do Estado. A poda – para dar lugar a imóveis – deve chegar a oito milhões de acres nos próximos 30 anos (dados do Serviço de Estabilização e Conservação da Agricultura dos Estados Unidos).
Jornal do Brasil Se é para internacionalizar a floresta, que seja a deles
Legalmente, 80% das árvores estão à mercê das serras elétricas
Osmar Freitas Jr.
A internacionalização das florestas americanas adquire caráter de urgência – 80% de suas árvores estão legalmente à mercê das serras elétricas. A exploração industrial da madeira vem derrubando cerca de 2% da mata anualmente. O professor Ben Van Pluijm, da Universidade de Michigan, do curso de Mudanças Climáticas (Global Change 2), diz que se este processo não for revertido, haverá desflorestamento completo em 70 anos.
As estatísticas apontam que o corte está aumentando o ritmo. A área em questão, com 522.300 km², é considerada parte do maior ecossistema do planeta. Chama-se Floresta Boreal do Alaska. Ninguém, no entanto, fala em dar à Organização das Nações Unidas – ou a qualquer outra instituição internacional – a soberania da região.
A julgar pelo passado daqueles que deveriam cuidar desta mata – uma das três principais florestas primárias do mundo, juntamente com a Amazônia e a Boreal da Rússia – o futuro é negro. Sem sombra de dúvidas, ou de árvores. Entre os anos de 1600 e 1920, 90% das matas virgens que cobriam os 48 estados continentais americanos foram dizimadas (veja o quadro na página seguinte). Poda equivalente a 1 milhão de km². A política de terra arrasada chegou ao terceiro milênio munida de machados, serras elétricas e torres de extração de petróleo.
História
Nos EUA, desde 1980, cerca de 40.500 km² de matas foram convertidos em subúrbios de alta concentração demográfica. Na região sul do país, nos próximos 40 anos, nada menos do que 125 mil km² vão desaparecer sob o asfalto e calçamento de empreendimentos imobiliários. Será a morte da última geração de reflorestamento, que, diz-se, replantou 2/3 de tudo o que foi cortado desde a chegada dos colonizadores.
– O que não se leva em conta na suposta recuperação da mata é o tipo de floresta reerguida – diz o professor Dr. Bruce Raislback, da Universidade da Georgia.
Raislback, como a maioria dos cientistas, diz que é preciso olhar a árvore para entender a floresta (numa inversão do provérbio Zen).
– Uma floresta de eucaliptos é uma plantação de fazenda como, digamos, a de soja. Não há biodiversidade e, pior, o que foi plantado já está destinado ao machado. O que se fez em muitas áreas ditas reflorestadas nos EUA foi o plantio de pinho, para uso na indústria da construção. Onde havia castanheiras, carvalhos e outras espécies, hoje se tem matéria prima para casas. Isso não é reflorestamento – diz o Dr. Eliot Spalder, pesquisador no Jardim Botânico do Bronx, em Nova York.
Cristovão Colombo descobriu a América à bordo de frutos do desmatamento europeu. A Era dos Descobrimentos provocou corrida às florestas do Velho Mundo, para aproveitamento de madeira na construção de navios. Foi o maior corte das matas no planeta desde a Revolução Neolítica (com a invenção da agricultura) na zona do Levante. As múltiplas guerras entre Grã-Bretanha e Espanha – envolvendo a França, Portugal, Holanda e outros países da atual União Européia - também impuseram o reforço das armadas navais destes países. E fizeram os machados trabalharem a toque de caixa. Hoje, as florestas européias estão reduzidas a 3% do que eram originalmente.
Os puritanos ingleses que chegaram no famoso navio Mayflower, dando pontapé inicial na tomada da América pelos ingleses, também vieram a bordo de pequeninos restos das florestas européias. Trataram logo de pavimentar – em sentido figurado e ao pé da letra – as terras do Novo Mundo. Em pouco mais de 300 anos, pelaram uma zona com dimensões continentais. Até 1600, os europeus desconheciam o arado com lâmina em forma de V – que os chineses utilizavam há 2 mil anos. Arava-se a terra com uma lâmina de metal, mais ou menos no formato de uma pá, o que requeria os esforços pesados de seis bois e um homem adulto. Era muito difícil o cultivo de grandes extensões. Com a chegada da novidade tecnológica, era possível fazer o plantio de áreas muito maiores com apenas um ou dois bois e um condutor minguado. Esta revolução de modus operandi – passada imediatamente à América do Norte – gerou fartura e riquezas, que por sua vez bancaram o Iluminismo.
O mesmo Iluminismo que inspirou os "Pais da Pátria" na independência americana, além do pensador Jean-Jacques Rousseau, desaguou em vertente filosófica do ativismo ecológico atual. Movimento construído sob espólios de matas derrubadas em dois continentes.
A explicação de porque não fizeram isso é meio óbvia, e é dada pelo: "Caso fizéssemos o reflorestamento desta área, os EUA não seriam mais a maior potência do mundo e boa parte da população sucumbiria à fome, miséria e falta de moradia". Quanto à idéia de internacionalizar a Floresta Boreal do Alaska, o professor de Economia Ambiental Richard Luger, da Universidade do Arizona diz:
– Só um louco para propor isso. Os EUA mandariam de volta à Idade da Pedra quem tentasse – diz.
Dá para acreditar, é só ver o que restou das terras indígenas que resistiram aos colonizadores.
O Estado de São Paulo Farc tentam comprar mísseis no mercado negro
Traficante de armas preso na Tailândia negociava com a guerrilha colombiana desde setembro de 2006
Roberto Godoy
O comando das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) está tentando comprar 100 mísseis antiaéreos Igla, de porte pessoal, no mercado clandestino de equipamentos militares. É uma arma simples e eficiente, disparada por um só combatente. O Igla pode destruir alvos aéreos a 5.200 metros de distância e altitudes entre 10 metros e 3,5 mil metros. O conjunto de lançador e míssil pesa 16 quilos. Custa cerca de US$ 60 mil.
O fornecimento estava na agenda de negociações entre Raúl Reyes - o número 2 da guerrilha morto no ataque colombiano contra um acampamento das Farc no Equador, em 1º de março - e Viktor Bout, o mais notório dos operadores do mercado negro de sistemas militares. Bout, tajique com nacionalidade russa, foi preso em Bangcoc, na Tailândia, em 6 de março quando negociava o lote de mísseis Igla com traficantes australianos e do Leste Europeu. A informação chegou ao conhecimento da rede de inteligência militar e da Polícia Federal brasileiras por meio de um detalhado relatório confidencial assinado pelo diretor da agência de segurança interna da Tailândia, Petcharat Sengchai.
O documento, a que o Estado teve acesso, destaca os contatos mantidos entre Bout e outro importante traficante, o libanês Monzer al-Kassar, que vive na Espanha. Preso em Madri seis meses antes, ele mantinha contatos com Bout por meio da filha única, Mahiba, personagem freqüente do eixo Rio-Buenos Aires. Em fevereiro, os dois se encontraram em um hotel da região de São Conrado. O tajique, que viaja em um avião de carga Ilyushin convertido em escritório, deixou a aeronave na Argentina.
Um oficial brasileiro da área de inteligência acredita que os dois tenham usado identidades falsas e tratado de detalhes para a entrega de explosivos, armas, munições e dos mísseis leves. Bout declarou às autoridades tailandesas que vinha negociando a entrega de suprimentos para as Farc desde setembro de 2006. Seu contato principal era Reyes. Eventualmente, entrava em cena o novo líder da guerrilha, o antropólogo Alfonso Cano, que assumiu o posto depois da morte de Manuel Marulanda, o “Tirofijo”.
Em Bogotá, o documento do inspetor Sengchai foi considerado “a comprovação de nossas piores suspeitas”, segundo declarou, por meio de um porta-voz, o comandante das Forças Armadas colombianas, general Freddy Padilla. Recorrendo ao conteúdo dos três computadores apreendidos no acampamento destruído no bombardeio de março, Padilla lembra das citações ao “amigo da Bielo-Rússia” que sugere “as vias do mercado negro” como melhor opção para a entrega da “encomenda”.
O “amigo” seria Victory Sheyman, secretário do Conselho de Segurança e Defesa de Minsk, e a “encomenda” o conjunto de mísseis Igla, um negócio de alto valor, entre US$ 600 mil e US$ 800 mil. Com essa arma, também adotada pelo Exército do Brasil, os guerrilheiros poderiam resistir à ação de aeronaves de vigilância e a ataques com helicópteros e aviões leves.
O Estado de São Paulo 'Mundo tem de pagar pela Amazônia'
Para governadora, o País deve receber verba de outras nações e elas não devem ‘dar um pio’ sobre o destino do dinheiro
Herton Escobar
Se a comunidade internacional está mesmo preocupada com o futuro da Amazônia, deveria dar dinheiro ao Brasil para garantir a sua conservação - porém, sem dar “um pio” sobre como o País deve gastar os recursos. Essa é a posição da governadora do Pará, Ana Júlia Carepa (PT). Segundo ela, os países ricos têm “obrigação” de pagar pela conservação da floresta, em retorno pelos serviços ambientais prestados por ela. “O mundo tem que pagar sim”, disse Ana Júlia ao Estado. “Eles destruíram as florestas deles, mas nós ainda temos a nossa.”
Em sintonia com o governo federal, a governadora defende a criação de um fundo nacional, para o qual os países desenvolvidos poderiam - ou “deveriam” - doar recursos para a conservação da Amazônia. “Eles têm obrigação de contribuir e não têm de dar um pio sobre como vamos utilizar esse recursos”, disse. “Falo isso porque são eles que pressionam a floresta.”
Na quinta-feira, o governo federal anunciou que vai montar um grupo interministerial para estudar a criação de um Fundo de Proteção e Conservação da Amazônia. O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, garantiu que o Brasil terá autonomia sobre os recursos, geridos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
No ano passado, o Pará foi responsável por metade da área desmatada na Amazônia. Ana Júlia diz que o desmatamento não é um problema ambiental, mas econômico, e que só será resolvido quando a floresta em pé se tornar mais lucrativa do que a floresta cortada - por exemplo, via pagamento por serviços ecológicos, como produção de água, controle climático e conservação da biodiversidade. “Só repressão não é suficiente. Precisamos de uma alternativa econômica.”
O Pará lançou um projeto para plantar 1 bilhão de árvores em cinco anos. A idéia é financiar o reflorestamento de áreas desmatadas com espécies de valor comercial, que possam se transformar em fonte de renda para os proprietários. A recomposição seria feita com espécies nativas, mas também com o eucalipto - uma opção que promete criar conflito com ambientalistas.
A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como a senhora vê o cenário atual de aceleração do desmatamento na Amazônia?
Estamos trabalhando não só para diminuir o desmatamento, mas para estabelecer uma política econômica que vá na direção contrária do desmate. Entendemos que o desmatamento é um problema de caráter econômico. O que pressiona a floresta é o consumo, da madeira e da energia (carvão vegetal). Então, para combater essa lucratividade, só mesmo outra atividade econômica com a mesma intensidade, mas na direção contrária. Por isso lançamos o programa de 1 bilhão de árvores. Queremos que os trabalhadores rurais e empresários possam ganhar dinheiro plantando floresta.
O reflorestamento evita que novas áreas sejam desmatadas? Como? Muitas espécies lucrativas demoram décadas para crescer.
Daqui a alguns anos não vai ser preciso derrubar mais nenhuma árvore. Já temos espécies que produzem em cinco ou seis anos, como o paricá, que é uma espécie nativa. Tem também espécies não nativas, como o eucalipto, que atinge condições de corte em cinco ou seis anos. Queremos investir em ciência e tecnologia para que tenhamos outras espécies. Você não pode dizer simplesmente que ‘não vai ter mais desmatamento’, precisa dar uma alternativa, porque elas (as pessoas que desmatam) também são seres humanos, são pessoas que passaram décadas sobrevivendo dessa atividade e nunca foram incomodadas. Em tese, tinha a fiscalização do Ibama. Mas como era feito isso? Eles apreendiam a madeira e o fiel depositário era o próprio madeireiro, que depois dava um jeito de usar a madeira. O que mudou aqui é que o Estado passou a ser o fiel depositário, aí fazemos um leilão e o recurso vai servir para estruturar os órgãos de combate ao desmatamento.
O desmatamento, então, tem conseqüências ambientais, mas as causas são econômicas?
Exatamente. O que é que pressiona a floresta? Por que é que os outros países destruíram e queimaram suas florestas? Por pressão de consumo, essa que é a verdade. Dizer que a pobreza pressiona a floresta é uma bobagem; o que pressiona a floresta é exatamente o contrário, é a riqueza.
Riqueza de dentro ou de fora da Amazônia?
De fora, claro. Uma pequena parte está dentro da Amazônia, porque o desmatamento é uma atividade lucrativa para pouquíssimos, é concentradora de riqueza. Nosso programa é para criar mecanismos que incentivem os produtores rurais a reflorestar. Nosso instituto de terras vai dar prioridade de regularização fundiária para quem fizer o cadastro ambiental rural. As pessoas vão poder recompor a área e ainda ganhar dinheiro.
Ganhar dinheiro como?
Quando plantarem, parte dessa floresta será de espécies com potencial econômico. Queremos também captar recursos com créditos de carbono.
Potencial econômico extrativista ou madeireiro?
O valor extrativista também é importante, mas fizemos os cálculos com base no valor madeireiro, de espécies como paricá e eucalipto.
Então o eucalipto vai valer como espécie de reflorestamento?
A Embrapa está fazendo pesquisa com 15 espécies nativas do Estado para aproveitamento econômico. Precisamos agilizar esse tipo de pesquisa.
Mas o eucalipto entra?
Veja bem, essas áreas estavam desmatadas. A idéia não é derrubar a floresta, é reflorestar. Parte desse 1 bilhão será mesmo de valor econômico. Não vamos incentivar que se plante só eucalipto; não é essa a proposta.
Por que é tão difícil acabar com o desmatamento?
Sabe qual é o lucro do desmatamento? US$ 270 mil por quilômetro quadrado por ano. O lucro da pecuária é de US$ 15 mil km2/ano. O da soja é de US$ 24 mil km2/ano. E o do reflorestamento é de US$ 125 mil km2/ano. Então, essa é a atividade econômica que mais se aproxima do lucro do desmatamento. Temos dificuldade para combater o desmatamento, sim, porque há interesses econômicos imensos. O lucro é muito alto.
A floresta tem de dar dinheiro em pé, se não cai? É isso?
Se der dinheiro, vai deixar de ter pressão. Outra coisa que temos colocado é que é preciso pagar por serviços ambientais. Não é justo que o mundo que já destruiu suas florestas cobre alguma coisa do povo da Amazônia. Alguém tem direito de exigir que esse povo não tenha acesso a bens de consumo, a energia elétrica, a qualidade de vida? Ninguém pode ousar exigir isso do nosso povo. Por isso é justo cobrar por serviços ambientais, para que não se desmate, para que se possa viver dos produtos florestais. A política de preço mínimo do governo federal (para produtos extrativistas) já foi um grande avanço. O mercado internacional também pode valorizar o produto florestal.
E a única opção que as pessoas encontram para sobreviver é derrubar a floresta?
O problema é que foi assim por muito tempo. Não estou falando de 50 mil pessoas, estou falando de 1 milhão, que durante décadas nunca foram incomodadas. O prejuízo agora não pode ser justamente delas. Não temos como controlar isso; não temos como encher o Estado de fiscais. Não posso ter só ações reativas, preciso de ações proativas, que possam gerar emprego, renda, desenvolvimento, sem destruir.
Quem deveria pagar pelos serviços ambientais? O próprio Brasil ou os governos estrangeiros?
Primeiro temos de regulamentar isso aqui, no nosso país. Eu sou favorável a que tenhamos também um fundo com soberania nossa, para que o mundo inteiro pague. Ora, o mundo tem de pagar sim. O mundo que já destruiu. Eles não têm moral para criticar nada.
A senhora acha que outros países têm obrigação de financiar a conservação da Amazônia, ou seria mais uma ação filantrópica?
Eles têm obrigação, sim, e ainda não têm de dar um pio em relação a como vamos utilizar esses recursos. São eles que pressionam a floresta.
Como a senhora vê a agropecuária dentro da Amazônia?
O Pará já tem o quarto rebanho do Brasil. Queremos fazer com que essa pecuária seja intensiva. Não há necessidade de desmatar mais nada; podemos aumentar a produtividade sem aumentar as áreas.
Há casos em que o desmatamento se justifica?
Acho que o desmatamento pode acontecer em situações que seja necessário fazer uma obra. Não vou deixar de fazer uma obra importante, seja de saneamento, uma hidrelétrica, um gasoduto, uma estrada. Posso fazer isso de forma sustentável, sem depredar a natureza. É isso que não se admite mais. Daqui a algum tempo vamos ter desmatamento praticamente zero, porque o pouco desmatamento que tiver será compensado com reflorestamento.
Como a senhora vê esse suposto conflito entre desenvolvimento, infra-estrutura e conservação?
Nós não podemos permitir que os impactos sejam colocados todos na conta do meio ambiente. Quando você tem a obra de uma estrada, ou da eclusa de Tucuruí (no Rio Tocantins), o impacto maior não é ambiental, é social. É sobre como ter infra-estrutura e planejamento para que o Estado possa receber milhares de pessoas da noite para o dia. Mas cai tudo na conta do meio ambiente. Claro que queremos minimizar todos os impactos, mas não tem como ter geração de energia sem nenhum impacto. O que não vamos admitir, e eu já falei isso para o presidente Lula, é ter uma hidrelétrica e o povo daqui não ter energia. Isso não dá mais.
O Estado de São Paulo 'Assentamento ajuda desmate'
Greenpeace acusa Incra de conluio com madeireiras e afirma que não há estrutura nem apoio para extrativismo
João Domingos
Para pôr mais fogo no debate a respeito do desmatamento da Amazônia, documento do Greenpeace acusa o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de trabalhar em conluio com os madeireiros para derrubar a floresta na região de Santarém, no Pará. O documento, de agosto do ano passado, chegou ao Palácio do Planalto e aos diversos ministérios envolvidos com a questão ambiental, como Agricultura, Desenvolvimento Agrário e Meio Ambiente.
“O Incra continua utilizando áreas florestadas para realizar reforma agrária. Nosso estudo demonstra que na região de Santarém o instituto tem privilegiado a reforma agrária na floresta, em vez de desapropriar as áreas já griladas”, afirma o estudo da organização não-governamental. “Mais que isso, o esquema verificado mostra uma ‘parceria público-privada’ para o saque do patrimônio ambiental brasileiro, em áreas públicas, no momento em que o próprio governo prepara a implementação da Lei de Gestão de Florestas Públicas”, continua o texto, de 32 páginas.
Por intermédio de sua assessoria de imprensa, o Incra responde que o Greenpeace e o Ministério Público de Altamira (PA) uniram-se contra o instituto “a partir de alguns fatos verdadeiros - e a maior parte falsos”. Diz o Incra que, de fato, existe um assentamento na região de Santarém que o MP afirma ser fantasma “porque da lista de assentados pouca gente foi para a área. E alguns venderam seus lotes para madeireiras, o que é ilegal. Ou não venderam os lotes, mas permitiram que a madeireira entrasse no lote e tirasse a madeira.”
O Greenpeace afirma, no documento, que a experiência de Santarém mostra a falência do modelo de assentamento extrativista devido à falta de investimentos. “Em vez de investir nos assentamentos de forma a garantir o uso sustentável dos recursos naturais (...) com assistência técnica, o Incra prefere aceitar a relação de dependência dos assentados com as madeireiras, em troca de benfeitorias que o próprio instituto deveria estar fazendo, como estradas e escolas.”
De acordo com o Greenpeace, as madeireiras foram para o assentamento e, num breve período, retiraram toda a madeira do local, antes mesmo de terem licenciamento ambiental ou plano de manejo aprovado. “Soma-se a isso um cenário de (...) baixa capacidade operativa dos órgãos federais como Incra e Ibama.”
Em sua defesa, o Incra alega que, quando confirmou a presença de serrarias no assentamento, notificou o Ibama e a Polícia Federal. E que até hoje o assentamento não foi regularizado porque o MP entrou na Justiça e conseguiu proibir o Incra de fazer qualquer obra em dezenas de assentamentos da região enquanto não obtivesse a licença ambiental. “A Superintendência de Santarém está correndo atrás das licenças, mas demora porque precisa fazer para cada assentamento um Plano de Desenvolvimento e um de Recuperação (PRA) em caso de áreas degradadas”, justifica-se.
O Estado de São Paulo Encomendas aos estaleiros crescem e esbarram na falta de mão-de-obra
Escassez de trabalhadores ameaça planos da Petrobrás de ampliar frota para explorar novos campos de petróleo
Renée Pereira
O novo programa de contratação de embarcações da Petrobrás, lançado no fim de maio, acendeu sinal de preocupação ao setor naval. A expectativa é que, para atender à parte da demanda de 146 unidades de apoio, 23 petroleiros e 40 navios-sondas, seja necessário contratar 25 mil trabalhadores na construção e 3.800 tripulantes para comandar a frota. Essa seqüência de grandes números seria ótima notícia se não houvesse escassez de mão-de-obra qualificada no País.
A origem do problema remonta aos anos 80, quando a construção naval sofreu forte retração mundial. No Brasil, a indústria ficou 15 anos sem construir um único navio de grande porte, o que afastou funcionários e dificultou a especialização. A partir de 2003, o governo Lula decidiu usar o poder de compra da Petrobrás para desenvolver a capacidade de construção de navios no País.
No início, o trabalho ficou restrito à modernização das embarcações. Aos poucos, com o crescimento da atividade econômica e novas descobertas de reservas de petróleo e gás no País, as encomendas foram ganhando força. Como os estaleiros mundiais estão com a capacidade tomada, preços e prazos elevados, o Brasil teve a preferência de empresas estrangeiras, como a venezuelana PDVSA, que contratou dez petroleiros da Eisa. Em 2007, veio a encomenda de 26 navios de grande porte da Transpetro (subsidiária da Petrobrás).
Com tantos projetos, entre 2003 e 2007 o número de trabalhadores do setor saltou 433%, de 7.500 para 40 mil. O problema é que a indústria naval absorve a mesma mão-de-obra da indústria petroquímica e metalmecânica, também em expansão, diz o presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), Ariovaldo Santana da Rocha.
Segundo ele, o déficit de empregados envolve desde engenheiros a profissionais de chão de fábrica de nível médio ou técnico, como soldadores, maçariqueiros e caldeireiros. “Nos cargos mais técnicos, apesar de o custo ser alto (R$ 900 mensais por pessoa), a gente tem conseguido fazer capacitação nos estaleiros e escolas especializadas. O problema são os engenheiros, cuja formação demora cinco anos”, afirma o executivo.
Além disso, esses profissionais são disputados a tapa pelo setor financeiro, cuja remuneração é maior e o trabalho, menos pesado. Rocha diz que o salário de um técnico está em torno de R$ 1.700. “No caso de engenheiro, depende de negociação, já que, em alguns casos, temos de trazê-lo de outra empresa. Estamos no ponto de buscar o estudante na porta da faculdade para treiná-lo.”
A média de idade dos engenheiros, no entanto, ainda é alta. Está na casa de 50 anos, conta o presidente do Estaleiro Aliança e da Companhia Brasileira de Offshore (CBO), Luiz Maurício Portela. Boa parte foi formada no fim da década de 70, quando o setor estava em alta. O executivo diz que o problema de mão-de-obra é sério e precisa ser resolvido com urgência. “No cenário atual, não tem gente para atender a todas as encomendas planejadas pela Petrobrás e pelo mercado.”
A consultora de recrutamento da Manager Priscila Telles confirma que encontrar profissionais na área naval, como projetista e calculista, é um desafio. Junta-se a isso a falta de fluência em alguma língua estrangeira. Como os projetos são feitos em outros idiomas, é requisito imprescindível para contratação.
Outro gargalo deve surgir quando os navios já estiverem prontos e em operação. Isso porque todas as embarcações precisam de tripulantes especializados, destaca o vice-presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma), Roberto Galli. O executivo destaca que hoje o setor está trabalhando sem reserva de comandantes de navios. Esses profissionais precisam passar por curso da Marinha Mercante, cuja duração está em torno de três anos mais um anos de estágio. “Teremos períodos difíceis pela frente.”
O Estado de São Paulo Práticos, os manobristas do alto mar
Marinha fará concurso para 117 vagas
Por trás do vaivém dos navios nos portos, um exército de homens, muito bem preparados, trabalham dia e noite para garantir a segurança das embarcações que atracam nos terminais. Eles são os práticos, profissionais responsáveis pela manobra de navios, desde a entrada no canal do porto até o cais. Apesar de centenária, a profissão é pouco conhecida.
Os práticos são gerenciadores de risco. Trabalham para evitar qualquer tipo de acidente com os navios e manter a ordem nos terminais. Em Santos, por exemplo, a atenção tem de ser redobrada. Com calado de 13 metros, as embarcações passam a 50 centímetro do solo. Um erro no trajeto pode significar um navio atolado no canal, o que causaria transtorno e prejuízo.
Por isso, o prático precisa ter amplo conhecimentos de navegação, condução das embarcações e, principalmente, saber as particularidade locais, como correntes e variações de marés, limitações dos pontos e os perigos submersos. Mas, além de tudo, precisa ter preparo físico.
Para chegar ao topo do convés e auxiliar os comandantes, eles precisam escalar a parede de aço do navio por meio de uma escada, aquelas feitas de cordas, muito comuns nos filmes de ação. Detalhe: muitas vezes tudo isso tem de ser feito com o navio em movimento, debaixo de chuva e à noite. “Alguns navios chegam a ter até 145 degraus”, conta Fábio Mello Fontes, de 69 anos, sendo 39 como prático.
Hoje, a idade média dos práticos em Santos está em 60 anos. Por isso, com a possibilidade de muitos se aposentarem, a Marinha prepara concurso para 117 vagas (22 para Santos). Até agora 2.500 pessoas estão inscritas, atraídas pelas vantagens da profissão.
Em Santos, eles trabalham dois dias e folgam seis. Além disso, há quem afirme que o salário mensal chegue a R$ 100 mil. Normalmente, os práticos formados se tornam sócios de uma empresa privada de praticagem. Em Santos só há uma, com 35 práticos. Número que subiu para 44, por determinação da Marinha, para suprir a alta da demanda.
O Estado de São Paulo Infraero vai usar biodiesel em veículos
A Infraero informou ontem que está estudando a utilização de combustíveis alternativos e fontes de energia renováveis e ambientalmente limpas. Segundo o órgão, uma das principais iniciativas é o Projeto Biodiesel, que prevê a adição gradativa, até 2010, desse combustível em máquinas, equipamentos e frotas da Infraero. A empresa, assim, seria a única no mundo no setor de administração aeroportuária a usar o biodiesel. A meta da empresa é acrescentar 20% de biodiesel (B20) ao óleo diesel convencional já a partir deste ano, inicialmente em três aeroportos: Cumbica, Viracopos e Congonhas.
O Globo Nobel no Planalto contra o aquecimento global
Efeito estufa e demanda por energia são desafios da pesquisadora, nomeada por Minc secretária de Mudanças Climáticas
Bernardo Mello Franco
BRASÍLIA. A posse de Carlos Minc no Ministério do Meio Ambiente levou para o governo uma vencedora do Prêmio Nobel da Paz: a nova secretária de Mudanças Climáticas, Suzana Kahn Ribeiro. Professora da Coppe/UFRJ, ela é a única mulher brasileira no IPCC, o painel de mudanças climáticas que recebeu a láurea com o ex-vice-presidente americano Al Gore. Carioca do Leblon, a pesquisadora ainda espera a nomeação, mas já desembarcou em Brasília com metas ambiciosas. A principal é convencer o país de que o aquecimento global não é conversa de ecologista. E de que seus efeitos, como a elevação do nível do mar e o aumento das enchentes, serão mais dramáticos para os pobres:
- Os temporais afetam mais quem está no alto da favela do que quem está no asfalto. O aquecimento global vai agravar as desigualdades.
Ex-assessora de Minc na Secretaria estadual do Ambiente, Suzana recebeu a missão de ajudar o país a reduzir a liberação de gases que provocam o efeito estufa. Como o desmatamento ainda responde por 55% do carbono que o Brasil joga na atmosfera, ela quer levar a nova bandeira à velha luta contra as derrubadas. Mas lembra que o problema não está só na Amazônia, maior foco da discussão.
- O deslocamento da fronteira agrícola e a abertura de novas pastagens no Cerrado também dão uma contribuição importante para o aquecimento - diz.
A secretária adverte que o festejado crescimento econômico fortalece outro vilão do clima: a demanda por energia. E anuncia uma possível nova briga entre o Ministério do Meio Ambiente e o setor elétrico. Enquanto a gestão de Marina Silva impôs regras mais rígidas ao licenciamento das usinas, Minc quer obrigar os donos de novas termelétricas a investir parte dos recursos na geração de energia renovável - uma norma que já vigora no Rio por decreto do governador Sérgio Cabral.
- Como o potencial hidrelétrico está se esgotando, a matriz energética brasileira vai ficar mais suja. Esse é o setor mais difícil para reduzir as emissões - diz Suzana.
O Globo Varig: Procuradoria da Fazenda sofreu pressão
Segundo ex-procurador, Planalto foi contra parecer que isentava comprador da aérea de assumir R$2 bi em dívidas
Martha Beck
BRASÍLIA. A ação do governo para concretizar a operação de venda da Varig também atingiu a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN). O ex-procurador-geral da Fazenda Nacional Manoel Felipe Brandão admitiu ao GLOBO ontem que sofreu pressões do Palácio do Planalto para mudar seu parecer relativo à operação, no qual entendia que o comprador da Varig deveria assumir as dívidas tributárias da empresa com a União, em torno de R$2 bilhões.
- Houve uma pressão, que é comum quando há entendimentos técnicos diferentes sobre algum assunto - disse Brandão, que deverá ser convocado pela oposição para falar na Comissão de Infra-estrutura do Senado.
Segundo Brandão, seu parecer apenas confirmava o que diz a lei de recuperação judicial: que uma empresa do perfil da Varig não poderia se dividir para ser vendida. O ex-procurador afirma que uma companhia com patrimônio, e que esteja em dificuldades financeiras, pode vender unidades produtivas que ajudem a reunir recursos para honrar suas dívidas. O que não era o caso da Varig.
- A Varig não tinha patrimônio nem unidade produtiva para vender. O que acabou comprado foi o direito de uso do nome e os espaços da empresa nos aeroportos - afirmou ele.
Com a saída de Brandão do comando da PGFN, seu sucessor, Luiz Inácio Adams, emitiu um parecer favorável ao que o Planalto queria: que a Varig poderia ser vendida sem sucessão tributária, ou seja, sem o repasse da dívida ao novo comprador.
Ontem, o ex-procurador-geral evitou polemizar ou fazer análises sobre o que teria levado o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a substituí-lo por Adams. No entanto, ele admitiu que o caso Varig foi um elemento importante para sua saída:
- Sofri resistência. Tanto é que saí. Minha situação ficou insustentável.
Sua troca por Adams foi cercada de polêmica. Os dois tinham diferenças não só em relação à Varig, mas também sobre a forma de condução da carreira dos funcionários da PGFN. A rivalidade dividiu a equipe da Procuradoria, e muitos integrantes ligados a Brandão também deixaram os cargos com sua saída.
A venda da Varig será discutida na quarta-feira na Comissão de Infra-estrutura do Senado, que ouvirá depoimentos da ex-diretora da Anac Denise Abreu - que acusou a Casa Civil de favorecer o comprador da Varig - e outros diretores envolvidos nas negociações em 2006. A convocação foi aprovada a pedido da própria base governista.
A oposição quer ampliar a lista de depoentes, incluindo Brandão. E, segundo o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), não está descartada a possibilidade de uma CPI para investigar as pressões do governo.
O Globo Crise da Anac expõe falha das agências
Governo é acusado de esvaziar instituições e elevar risco para investimentos
Liana Melo
Ao ser acusada de interferir na venda da VarigLog, a ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, respondeu às acusações afirmando estar sendo "vítima de fogo inimigo". Essa retórica não convenceu especialistas em regulação. Eles estão convencidos de que a denúncia evidenciou as falhas das agências reguladoras, o que poderá inibir investimentos no país. Duas delas, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e a Agência Nacional do Petróleo (ANP), têm cargo de diretor vago desde o fim de 2007 e 2004, respectivamente.
A ministra justificou a intervenção na Anac alegando que o governo queria evitar uma falência. Dilma nunca escondeu sua opinião sobre as agências reguladoras - herança deixada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que tirou as agências do papel no rastro das privatizações dos anos 90.
Segundo a advogado Valdo Rizzo, do escritório Lobo & Rizzo, o presidente Lula esvaziou as agências trazendo o "poder de volta para os ministérios". Rizzo advoga para empresas fiscalizadas pela Anac e ANP.
Esse esvaziamento deixou as agências à mercê de pressões do Executivo. Os diretores da Anatel não estão conseguindo chegar a um acordo sobre as mudanças no Plano Geral de Outorgas. A falta de definição está inviabilizando a supertele, que vai nascer da fusão da Brasil Telecom (BrT) com a Oi.
- O governo Lula é ambíguo em relação às agências, enquanto o governo FH era mais entusiasmado - compara Rogério Schmitt, da Tendências.
Lei das agências está parada no Congresso
O sinal mais claro dessa ambiguidade seria o fato de a Lei Geral das Agências Reguladoras, apresentada pelo próprio governo, estar paralisada no Congresso Nacional desde 2004.
A proposta já recebeu 140 emendas, 30% delas aproveitadas. Incluiu-se a definição das atribuições de ministérios e agências. Foi sugerida mais transparência, o que obrigará as agências a fazer reuniões públicas e divulgar antecipadamente a pauta das reuniões. Por fim, conselheiros e diretores terão mandatos de quatro anos, sem reeleição. Hoje, o mandato varia em cada agência.
- Pior do que desestimular investimento externo, a fragilidade das agências deixa o consumidor sem proteção - avalia o ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) Arthur Barrionuevo, da FGV de São Paulo.
Ainda à época do então chefe da Casa Civil José Dirceu, em 2003, o presidente Lula exigiu uma solução rápida, quando soube que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Anatel iriam aumentar tarifas. O ministro das Comunicações Miro Teixeira, então, anulou o aumento e anunciou que as tarifas seriam desindexadas
- A legislação que daria mais autonomia às agências reguladoras está parada no Congresso desde 2004 - diz Aloísio Araújo, professor da Escola de Pós-Graduação em Economia da FGV-Rio.
Segundo ele, o amadurecimento das agências no Brasil caminha lentamente. Já se passaram 12 anos desde que a Aneel saiu do papel, em 1996. Hoje, já são dez agências e a caçula delas é a Anac, criada em 2005.
- No Brasil e no exterior as agências vivem, de um lado, pressionadas pelo governo e, de outro, pelas empresas do setor privado que regula - analisa Schmitt.
O problema no Brasil, na opinião de especialistas, é que, das dez agências reguladoras, apenas Aneel e Anatel atuam de forma autônoma.
O Globo Planalto tenta controlar ocupação na fronteira
Governo encomenda levantamento para descobrir quem são os verdadeiros donos de terras em áreas estratégicas
Leila Suwwan
BRASÍLIA. O Planalto tem agido silenciosamente para tentar contornar o avanço que ocorre há tempos nas fronteiras do país e é considerado uma ameaça à soberania: a compra, posse ou uso de terras da chamada faixa de fronteira por grupos estrangeiros, sem o consentimento prévio do governo, conforme prevê a Constituição. Sem alarde, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) encomendou levantamento para cartórios dos 570 municípios fronteiriços para descobrir os verdadeiros donos dessas terras. E está discutindo com países vizinhos suas preocupações estratégicas.
Além das vulnerabilidades de segurança e defesa nacional, a faixa de fronteira é considerada alvo crítico também pela possibilidade de escoamento de minérios. Assim como as aquisições por estrangeiros, qualquer atividade de mineração nessas terras precisa ser aprovada pelo Conselho de Defesa Nacional.
Áreas de interesse se sobrepõem a terras indígenas
O monitoramento militar da região revela que grupos estrangeiros se interessam por pesquisa ou lavra em 115 mil km², o equivalente ao território de Santa Catarina e Sergipe somados. Em alguns casos, essas áreas se sobrepõem com terras indígenas. Segundo documento do GSI, o alvo da mineração são regiões sensíveis, em um cinturão que toma a fronteira norte desde o Amapá até o norte da Amazônia e a divisa de Rondônia.
A faixa de fronteira é a extensão de 150 quilômetros a partir dos 17.500 quilômetros da fronteira terrestre e que representa 27% do território nacional. As terras pertencem à União, mas há um caos jurídico na titulação de imóveis, muitos concedidos de forma irregular. No caso da presença estrangeira, há limites legais, mas não se tem idéia da situação real. Para tentar retomar o controle, o governo acionou os cartórios, em acordo firmado em março deste ano.
- Não há dados precisos e as compras estão sendo mascaradas com ONGs que têm capital estrangeiro. A preocupação é defender nossa soberania. Vamos ver quem é o dono e de quem é o investimento. Mas teremos de buscar a papelada, e isso deve demorar dois anos - disse Rogério Portugal Bacellar, presidente da Associação Nacional de Notários e Registradores do Brasil (Anoreg).
O cadastro de imóveis rurais do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária Incra (Incra) é considerado subestimado. Em todo o país, há registro de 33 mil imóveis em posse de estrangeiros em um total de 55 mil km², cerca de 70% disso na Amazônia. Mas, segundo o presidente do órgão, Rolf Hackbart, o dado verdadeiro é pelo menos cinco vezes maior, o que significa 275 mil km², área quase igual à de Tocantins.
- Isto não é xenofobia. O Estado precisa saber quem é o proprietário das terras e o uso desses imóveis. O debate às vezes fica escondido porque há um viés torto de que todo investimento é bom. No caso da fronteira, é onde o debate deve começar. E os cartórios são a única forma de conhecer os reais proprietários - disse Hackbart.
O Conselho Nacional de Defesa e o Gabinete de Segurança Institucional não se manifestam sobre o tema. Mas documentos internos mostram que a preocupação é grande e foi debatida com representantes de Venezuela, Bolívia e Equador no mês passado. O GSI diz que grandes empresas às vezes sequer registram a compra das terras e assim burlam a exigência de obtenção do "assentimento prévio", concedido pelo Conselho de Defesa Nacional. Outro problema é que os municípios também não repassariam os relatórios exigidos. E finalmente, também foi detectado que estrangeiros estão assumindo posse de terras sem efetivamente registrar o imóvel, o que também escapa do controle do governo.
O Globo Empresa de sueco no AM nega irregularidades
O empresa Gethal, do sueco Johan Eliash, divulgou nota ontem negando informações do Ibama de que há irregularidades no controle acionário da empresa, que atua no Amazonas. O Ibama investiga se a Gethal vendeu terras da região a uma outra empresa, formada por um fundo de ações americano. Segundo a Gethal, as informações são infundadas e a propriedade das terras segue as leis brasileiras.
A empresa nega ainda acusações de danos ambientais."A Gethal Amazonas S/A não incorreu em nenhuma atividade madeireira não autorizada durante a gestão dos novos acionistas e não tem conhecimento das acusações que supostamente pesariam contra a empresa".
O Globo Sete anos após ser extinta, Sudam ganha novo conselho
Processos por corrupção ainda tramitam no STF e na Justiça Federal
Ronaldo Brasiliense
BELÉM. Com um discurso de menos de um minuto de duração, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva empossou há uma semana, durante o encerramento do I Fórum dos Governadores da Amazônia Legal, o conselho deliberativo da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). O órgão, que tinha sido extinto por corrupção em 2001, no governo do tucano Fernando Henrique Cardoso, foi ressuscitado por Lula.
Em seu discurso, o superintendente da Sudam, Djalma Mello, não fez referência à ação da quadrilha que surrupiou R$2 bilhões dos cofres da autarquia, segundo cálculos do Ministério Público Federal e da Polícia Federal. Lula foi bastante sucinto:
- Quero dizer ao povo brasileiro que, quando uma instituição tem uma pessoa que cometeu um ato de improbidade administrativa, a gente pune a pessoa que cometeu e salva a instituição, porque, na verdade, a Sudam é muito importante para o desenvolvimento da Amazônia.
O Globo Garimpo ilegal cresce, diz Exército
BRASÍLIA. Os militares se preocupam com o avanço da mineração na faixa de fronteira, onde já são detectadas incursões ilegais de garimpeiros. São registrados ilícitos que variam da biopirataria ao tráfico de drogas. A preocupação do Exército está ligada às áreas de interesse, que fecham cinturões de fronteira - em muitas, há reservas indígenas, onde o Exército considera que sua atuação está dificultada. A Constituição permite o garimpo, mas a atividade precisa ser regulamentada por lei.
O Globo Lagoa de Araruama volta a dar sinal de vida
Construção de estações de tratamento de esgoto na região faz melhorar os índices de qualidade da água
Ludmilla de Lima
Uma das primeiras paisagens vistas por quem chega à Região dos Lagos, a bela Lagoa de Araruama sai de um período sombrio de sua história. Até 2006, não era preciso chegar muito perto para sentir os efeitos da degradação: bastava passar de carro pela RJ-106 para constatar a cor escura da lagoa, bem diferente das suas características originais, e o mau cheiro. Mas, há dois anos, esse cenário vem mudando, reflexo do funcionamento de quatro novas estações de tratamento de esgoto (ETEs) e a abertura, pela Superintendência estadual de Rios e Lagoas (Serla), do canal de Itajuru, que faz a ligação com o mar.
Antes da pressão pela construção das ETEs, inauguradas a partir de 2005 pelas concessionárias Prolagos (em Iguaba Grande, São Pedro D´Aldeia e Cabo Frio), e pela Águas de Juturnaíba (em Araruama), todo o esgoto desses municípios, que somam 356.082 habitantes, ia diretamente para a lagoa. Hoje, cerca de 65% da carga, ou 600 litros por segundo, são tratados, e a lagoa retoma, aos poucos, a cor azul esverdeada e a fauna que haviam desaparecido
- O maior problema do esgoto é que a lama tem alta carga de fósforo e nitrogênio, que são alimentos para algas. Estas são responsáveis pela cor escura da água e, em decomposição, geravam o mau cheiro que era comum na lagoa- explica o presidente da Serla, Luiz Firmino Martins Pereira.
Moradores estão animados com a volta do camarão
Além das águas mais claras, a prova da revitalização do ecossistema são os índices sobre a qualidade da lagoa monitorados mensalmente pela Serla, em parceria com a Universidade Federal Fluminense (UFF), Universidade Estácio de Sá e pescadores: os níveis de fósforo, que até 2006 atingiam a marca de 0,80 miligrama por litro, sofreram redução drástica, chegando a 0,03 em novembro do ano passado; já o nível de nitrogênio, que chegou a atingir de 4 a 9 miligramas por litro em meados de 2006, vem se estabilizando desde novembro de 2007 em 1 miligrama por litro.
A mesma curva decrescente se observa no índice de coliformes, que já atingiu a espantosa marca de 5 mil por cem mililitros. Hoje o nível varia de 30 a 50 por 100 mililitros.
Mas, para a população, o melhor sintoma da recuperação está no pescado. Espécies que desde a década de 90 estavam desaparecidas, por causa da poluição, retornaram à maior laguna hipersalina do mundo, com 220 quilômetros quadrados:
- Voltou o camarão da lagoa, que ficou muito tempo sem aparecer. Na infância, eu brincava de jogar moeda na lagoa para depois pegá-la, porque a água era transparente - lembra o advogado Eduardo Rosa, morador de São Pedro D'Aldeia.
Com revitalização, número de pescadores cresceu
Integrante da União das Entidades de Pesca e Aqüicultura do Rio de Janeiro (Uepa-RJ), Chico Pescador conta que na década de 90 o Ibama contabilizou 3 mil pessoas vivendo da atividade na lagoa. Com o crescimento da poluição na década de 90, esse total caiu para cerca de 300 pescadores:
- Os peixes do fundo da lagoa foram morrendo; o linguado e o camarão sumiram em 98. Mas, no ano passado, com o início da abertura do Canal de Itajuru, a lagoa começou a melhorar e hoje temos o linguado e o camarão de volta, e muito paru e carapicu, carapeba e tainha - conta o pescador, que vem ajudando no monitoramento da Serla.
Hoje existem cerca de 800 pescadores. Crescimento que é sinônimo do potencial econômico do lugar e importante também para o turismo.
- Na década de 70, eram 400 toneladas de camarão por mês. No final dos anos 90, apenas 40. Hoje são 3 toneladas por semana - contabiliza, com entusiasmo, o pescador.
Para que o processo de revitalização continue, ainda é necessária a conclusão da dragagem do canal de Itajuru pela Serla, investimento de R$12 milhões que vai ampliar a ligação com o mar, de 30 metros para quase 300 metros.
- Há um cordão arenoso que, quando é retirado, provoca uma melhora imediata na lagoa - afirma o ambientalista Arnaldo Villa Nova.
Lagoa ainda recebe 300 litros de esgoto por segundo
Também são necessários mais R$50 milhões em investimentos em outras ETEs para que todo o esgoto das cidades em volta passe a ser tratado. Ainda são despejados 300 litros de esgoto por segundo na lagoa. Na última semana, uma rede de algas flutuava sobre um dos canais em Cabo Frio.
O Globo No 3º choque do petróleo, 25 anos em 5 meses
De janeiro de 2008 até o último dia 6, barril subiu 44%, alta que o mundo levou duas décadas e meia para atingir
Ramona Ordoñez e Danielle Nogueira
O mundo já vive o terceiro choque do petróleo, 28 anos depois de ter sido abalado pela última disparada dos preços do barril. Mas este se caracteriza por uma crise de preço, não de interrupção da oferta. De 1º de janeiro de 2008 até o recorde de sexta-feira passada, quando o barril do petróleo leve americano fechou em US$138,54, sacudindo as bolsas e provocando protestos mundo afora, a alta acumulada foi de 44,3%. Desde o segundo choque, foram precisos 25 anos para que as cotações dessem salto semelhante, em valores nominais. Em 1980, a média anual de preço foi de US$36,83, passando para US$54,52 em 2005, avanço de 48%.
A discussão sobre o terceiro choque ganhou força após o Goldman Sachs ter previsto, em maio, que o barril poderia chegar a US$200 até o fim do ano. Desde então, até a Agência Internacional de Energia (AIE) ressuscitou a expressão que se achava enterrada. Mas poucos se arriscam a fazer previsões.
- É difícil prever quando pode chegar a esse patamar - diz o especialista Alexandre Chequer do escritório Tauil, Chequer & Mello Advogados.
Três fatores ausentes nos dois primeiros choques explicam, em boa parte, a atual escalada de preços, iniciada em 2002. O primeiro é a forte demanda por petróleo de países emergentes, especialmente a China. Desde 2002, quando o mundo começou a sentir com mais intensidade a força do crescimento chinês, a demanda de petróleo do país aumentou de 5,14 milhões de barris por dia para uma estimativa de 7,9 milhões de barris diários este ano, crescimento de 53,67%, segundo a AIE.
- A demanda não cai porque está sendo puxada por países que no passado não tinham esse consumo, como China e Índia - diz o diretor de Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa.
Além disso, lembra o especialista Adriano Pires, 51% da população mundial consomem gasolina subsidiada. Portanto, não têm preocupação em reduzir o consumo. Os outros dois fatores são a depreciação do dólar - desde 2002, a moeda americana teve desvalorização de cerca de 30% - e a negociação de contratos futuros da commodity em bolsas de valores, iniciada apenas em 1983.
- A desvalorização do dólar mascara o aumento real do petróleo. Há ainda um forte componente especulativo, por causa das negociações em bolsa - diz o consultor David Zylbersztajn.
Apesar da alta de preços, dificilmente o mundo entrará em recessão, como nos dois choques anteriores. No passado, o salto no preço foi repentino - a cotação média anual triplicou no primeiro choque e duplicou no segundo em 12 meses. Isso se deveu a cortes de fornecimento por alguns dos principais produtores, em retaliação a conflitos políticos, o que levou os EUA a frearem o consumo de combustíveis.
Hoje, não há falta de energia, embora o equilíbrio entre oferta e demanda esteja apertado. E, apesar da crise financeira americana, os países emergentes conseguem manter a demanda aquecida, evitando que a economia mundial desaqueça.
O aumento gradual de preços nos últimos anos também permitiu que o mundo se tornasse menos vulnerável, dando tempo aos consumidores para se adaptarem à mudança. Isso se reflete na mudança da matriz energética mundial. Em 1973, o petróleo respondia por 46,2% da oferta de energia do mundo. Em 2005, a fatia havia caído para 35%.
- Há um movimento na direção de outras fontes de matéria-prima - diz o coordenador da comissão de plásticos da Associação Brasileira da Indústria Química e vice-presidente da Braskem, Luiz de Mendonça.
Brasil está menos vulnerável que na década de 80
Em relação aos outros dois choques, o Brasil está hoje em uma situação bem mais confortável. Em 1980, no segundo choque, o país importava 85% do petróleo que consumia. Dois anos depois, o déficit na balança comercial fora de US$10 bilhões, principalmente por causa das importações de combustível. Hoje, o país é auto-suficiente, com produção diária de 1,85 milhão de barris. O déficit de petróleo e derivados acumulado nos quatro primeiros meses de 2008 é de US$550 milhões. Mas segundo Costa, da Petrobras, haverá superávit no fim do ano.
Apesar de menos vulnerável, o país não está imune. De janeiro a maio, o querosene de aviação (QAV) subiu 19,97%, elevando o peso dos combustíveis no custo das empresas de 35% para 45%.
- Certamente haverá alta de preço nas passagens - diz José Márcio Mollo, presidente do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea).
O Globo O melhor é apressar a exploração do pré-sal
Wagner Freire
Quando o Brent desabou para US$10 o barril em fevereiro de 1999, há apenas nove anos, a revista "The Economist" conjecturou que os preços iriam cair mais ainda, para US$5 o barril. Para o bem dos produtores de petróleo, isto não aconteceu e, na verdade, os preços não pararam de subir desde então e, um ano depois, já estava US$30 o barril. O resto vemos agora. Com ligeiras baixas e altas, o Brent está nos US$130. Vai chegar a US$200? Quando? E aí?
Os choques anteriores tiveram fortes componentes políticos. A conjuntura atual é bem mais complexa, com a globalização e as mudanças significativas no cenário mundial, com o crescimento acentuado da China e de outros países emergentes, a consolidação da União Européia, a forte presença da Rússia no mercado de petróleo, um mercado de futuros mais dinâmico, os problemas com a economia dos EUA, maior consumidor mundial de petróleo. Nesse quadro, o crescimento acentuado do consumo de commodities e de alimentos interage com o aumento dos preços de petróleo, com reflexos inflacionários e, como pano de fundo, a desvalorização do dólar em relação ao euro e a outras moedas e, mais acentuadamente, em relação ao real. Acho até que o desequilíbrio nas relações demanda/suprimento de petróleo é o fator menos relevante.
Mas temo que previsões opostas às da revista também possam ocorrer no aumento de preços deste nosso exercício. Será que o petróleo vai mesmo para US$200, num futuro imediato? Mas este não é o exercício. O que aconteceria com a economia mundial e a brasileira se esse cenário se materializasse? Na verdade, como o petróleo é referenciado ao dólar, a primeira reação de mercado ao seu aumento excessivo, é a sua desvalorização. Mas esse fator acaba sendo mais complexo ainda, por causa dos ajustes cambiais, que estão sujeitos a outras variáveis que afetam as moedas de forma diferenciada. Em 2007, o barril, expresso em dólares, aumentou 69%. No mesmo período, o euro se valorizou 12% em relação ao dólar e o real 25%. Portanto, tudo muito ruim para o consumidor americano, mas nem tão mal para o europeu, cujos preços aumentaram 57% e menos mal ainda para os brasileiros, com aumento de "apenas" 36%.
Seja como for, acho que os efeitos na economia mundial serão muito negativos. Quanto a nós, é melhor nos prepararmos para esse barril de US$200. O que fazer? Reabrir logo a oitava rodada. Apressar a exploração das áreas do pré-sal, de forma competitiva, sem afugentar os investidores. Assim, poderíamos em dez anos nos tornar um grande exportador.
O Globo Discriminação assusta Brasileiros reclamam de desigualdade
BERLIM. Segundo estatísticas oficiais 60 mil brasileiros vivem na Alemanha, sendo que 60% são mulheres que se casaram com alemães. Alda Santos, Cesar Cataldi Mello e Luzia Simons têm biografias típicas da população brasileira na Alemanha. Alda, de 41 anos, fez apenas o curso primário porque precisava trabalhar para ajudar a família em Ubatan, interior da Bahia. Ela viveu em Minas Gerais e São Paulo, onde conheceu o marido, o alemão Thomas Kleindienst, com quem tem um filho de 18 anos.
Quem é brasileiro e vive em Berlim termina um dia conhecendo Alda, que é dona do "Café do Brasil", restaurante na Avenida Mehringdamm, bairro de Kreuzberg, um dos preferidos pelos imigrantes.
- É claro que temos problemas na Alemanha, mas a sensação de segurança, um bom seguro de saúde, isso é para mim qualidade de vida - diz Alda.
Mas o preço da segurança material é alto: cerca de 15 horas de trabalho por dia e sem férias. A brasileira aponta para apenas um aspecto negativo no país: a discriminação de estrangeiros e a violência por parte de grupos neonazistas.
-- Uma vez eu fui perseguida e tive muito medo, porque na época não sabia falar alemão - lembra.
O carioca Cesar Cataldi Mello já dançou no Teatro Guaíra, de Curitiba, na Deutsche Opera de Berlim e em outros importantes palcos europeus. Ele vê a Alemanha de forma crítica, mas aponta erros também no comportamento dos brasileiros que vivem no país. Para ele, os brasileiros não querem se integrar e continuariam "cultivando a mesma vida que levavam no Brasil, com samba, sexo e futebol". Mas Cataldi, que além de bailarino é designer e coreógrafo, vê erros também na Alemanha:
- O país está com desnível enorme entre os que têm e os que não têm - conclui o carioca, que vive atualmente em Duesseldorf
O Globo IMIGRAÇÃO NA EUROPA
Filhos de estrangeiros que ajudaram a reconstruir país se sentem cidadãos de segunda classe
Sarkozy e o plano de fechar portas da Europa
Presidente francês quer fazer da questão bandeira à frente do bloco europeu. Na França, imigração já é seletiva
Deborah Berlinck
PARIS. O presidente francês, Nicolas Sarkozy, vai fazer da imigração sua grande bandeira ao assumir, em 1º de julho, a Presidência da União Européia (UE). Ele está propondo aos 27 países da UE um "pacto europeu sobre imigração e asilo" que consiste, essencialmente, em fechar as portas do continente.
Num texto que já circula, o presidente propõe à UE um controle mais rigoroso e coordenado das fronteiras. A idéia é que a partir de 2011, todos os membros adotem vistos biométricos, um sistema já aplicado nos Estados Unidos, que permite seguir o trajeto do viajante.
Os 27 membros, segundo o texto, deverão organizar a imigração no bloco de acordo com a capacidade de cada um, e renunciar à regularização maciça de ilegais. Deverão ainda impedir a imigração na fonte, ou seja, dando mais ajuda ao desenvolvimento dos países originários. "Está claro que a Europa não tem meios de acolher dignamente todos os que vêem nela um eldorado", diz o texto.
Empregar imigrante ilegal dá cadeia na França
Uma das primeiras ações de Sarkozy ao ser eleito há um ano foi adaptar a lei. A imigração na França é hoje seletiva. A lei prevê teste de DNA para pessoas que queiram trazer as famílias. Sarkozy propõe quase o mesmo à UE: "imigração escolhida e coordenada, que respeite as especificidades nacionais e leve em conta o mercado de trabalho."
Quando a França se reconstruía no pós-guerra e crescia a 5% ao ano, o país recorreu maciçamente a imigrantes das ex-colônias da África. Mas hoje, seus filhos enfrentam dificuldade de trabalho e se sentem franceses de "segunda categoria".
A revolta dos jovens da periferia em 2005 mostrou uma realidade distante dos costumes e do glamour da França. Muitos filhos de imigrantes reivindicam o direito de usar o véu islâmico. Num país que defende com unhas e dentes a tradição laica, a nova realidade incomoda. Sarkozy propõe à Europa que imponha a novos imigrantes "contrato de integração", que obrigue o aprendizado da língua e dos valores europeus, como a igualdade entre homens e mulheres. O alvo é claro: muçulmanos.
A luta contra os empregadores e as pessoas que abrigam imigrantes vai se intensificar se a proposta for aceita. Empresas estão inquietas. Jean-Pierre Alaux, do Grupo de Informação e Apoio a Imigrantes (Gisti), disse ao "Le Monde" que sua organização recebe cada vez mais estrangeiros em situação irregular que foram despedidos.
Desde 2007, empresas que empregam estrangeiros precisam verificar junto às prefeituras seu nome, país de origem e outras informações. Há um maior sentimento de que estão sendo vigiadas, sem contar o medo de multa e prisão. No ano passado, dois dirigentes da empresa de construção Cardinal foram condenados a três anos de prisão por empregarem estrangeiro. Segundo o governo, 5 milhões de imigrantes vivem na França (8% da população). Em 2005, estimava-se os imigrantes ilegais entre 200 mil e 400 mil.
O Globo Risco de prisão e turnos de 24 horas
Leis francesas abrem nicho para brasileiros
PARIS. Os paulistas Edivan Lima, 22 anos, e Anderson Gomes, 31 anos, têm uma história em comum: foram presos e expulsos da França. Mas ainda não saíram do país: seus passaportes estão retidos na polícia, e eles escaparam das grades e da deportação após prometer às autoridades francesas que comprariam passagem para voltar para o Brasil. Correm o risco de pegar prisão prolongada se não cumprirem a promessa. Seu crime: trabalhar clandestinamente.
Edivan e Anderson fazem parte dos cerca de 200 mil a 400 mil imigrantes clandestinos na França, na sua maioria, pessoas de ex-colônias francesas na África. Ignorando o mandado de expulsão, eles continuam trabalhando ilegalmente em Paris. Como todo clandestino, andam pelas ruas olhando para os lados e rezando para não serem escolhidos aleatoriamente, num controle policial.
Virou cena corriqueira em Paris, policiais parando "suspeitos", para pedir documentos. Edivan marcou sua passagem para o Brasil para o dia 28. Talvez pegue o avião. Já Anderson, que mora com uma francesa filha de mexicanos, trabalha ilegalmente na construção e planeja se casar. Ele decidiu correr risco maior, esperar que a polícia venha buscá-lo em casa para expulsão, na esperança de que isso não aconteça.
Anderson já foi preso duas vezes. E não desiste da França. Ele ganha 2.500 por mês trabalhando ilegalmente no setor de construção, emprego que conseguiu se apresentando como português. Seu patrão, que sabe de sua verdadeira identidade, segundo ele, corre risco dobrado na França de Nicolas Sarkozy. Por que empregar um clandestino? Anderson explica:
- Muito europeu não quer fazer o que faço, às vezes saio às 4h e trabalho mais de 24 horas direto. Tenho que colocar cimento no chão e esperar secar. Quando trabalho 14 por dia estou contente. Isso sem contar as viagens - conta.
No país onde vigora a lei que limita o trabalho em 36 horas por semana, e onde o direito do trabalhador é defendido com unhas e dentes, um clandestino que vira a noite trabalhando, sem dúvida, custa menos que um francês. Edivan, da cidade de Limeira, interior de São Paulo, que chegou a Paris em outubro de 2007, conta que a prisão foi a pior humilhação de sua vida.
- Algema é pior do que ser maltratado. Me senti sujo, só porque não tenho documentos. É como se eu não prestasse. Senti um pouco de discriminação, porque estava com roupa esporte e boné - diz.
O Globo Portugal expulsa menos que outros países da UE
Entre os imigrantes brasileiros, saem os profissionais liberais e entram os mais pobres
Priscila Guilayn
MADRI. Somente um de cada três processos administrativos de expulsão são executados, em média, nos países europeus. A média portuguesa é de um de cada cinco. Em 2007, foram entregues 6.155 das chamadas popularmente "cartas de expulsão"; foram instaurados 2.536 processos de expulsão e, apenas 511 imigrantes foram efetivamente enviados de volta a seus países de origem, dos quais 342 eram brasileiros. A rigidez que a maioria dos países europeus tem mostrado não se aplica em Portugal, segundo a socióloga Beatriz Padillla, do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia, de Lisboa.
- As leis de imigração em Portugal vão em direção contrária ao resto da Europa. A última reforma, aprovada ano passado, permitia processos de legalização, embora um pouco camuflados, e abria mais possibilidades para o imigrante em situação regular. Os brasileiros são os primeiros a se beneficiarem desta flexibilidade portuguesa - opina a socióloga, que nos últimos anos vem investigando a imigração brasileira.
Segundo alguns estudos, o perfil do imigrante brasileiro em Portugal mudou. Entre as décadas de 80 e 90, os brasileiros cruzavam o Atlântico com um currículo recheado. Quase um terço dos brasileiros em situação regular era de profissionais liberais, 27% eram estudantes; 10%, professores; 16% com uma qualificação média e apenas 5% eram considerados não qualificados.
Em 1999 a coisa mudou: 29% eram peões de obra; 25% empregados de restaurantes ou hotéis, e os não qualificados subiram para 27%. Nos fluxos mais recentes para Portugal, aumentou o número de jovens de classe média e baixa qualificação dispostos a dedicarem-se a serviços mal remunerados, quase sempre sem relação com a formação profissional adquirida no Brasil.
Mecanismos de legalização não são claros, diz advogado
A lei de imigração manteve o sistema de cotas para contratos legais de trabalhos para imigrantes (8.500 postos de trabalho num prazo de 2 anos) e facilitou o reagrupamento de familiares dos imigrantes, permitindo, por exemplo, que os filhos, dependentes com mais de 18 anos que ainda estejam estudando venham morar legalmente com seus pais em Portugal.
- Os mecanismos de regularização não são claros e a lei não ajudou nada neste sentido. Está baseada em conceitos excepcionais e subjetivos, que fazem com que a pessoa nunca saiba se vai conseguir ou não um visto - afirma o advogado Gustavo Behr, presidente da Casa do Brasil. - Para viver legalmente em Portugal, você já tem que vir do Brasil com o visto de trabalho e residência. Esta é a regra. Se não for dessa forma, o mais provável é que o pretendente não consiga legalizar sua situação nunca.
A população imigrante regular em Portugal - em maioria masculina e com idades entre 20 e 45 anos - , segundo algumas pesquisas recentes, se aproxima de meio milhão de pessoas, o que corresponde a cerca de 5% da população do país. O peso da população estrangeira, no entanto, ainda é considerado pequeno, quando comparado com outros países europeus. A comunidade brasileira é a maior entre os imigrantes em Portugal, seguida da cabo-verdiana e da ucraniana.
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